quarta-feira, 31 de outubro de 2012

MEU TATARAVÔ

Conto de Luís Jorge Ferreira

Meu tataravô namorou e casou com uma moça bem mais nova, honesta e trabalhadora que ele conheceu um dia em uma Tertúlia usando um vestido de tule azul, bonita e doce, viveu com ele até que a vida de ambos se fosse , juntos tiveram muitos filhos. Ele tinha uma tara enorme por tomarem banhos juntos, mas nunca tomaram.

O filho dele meu bisavô, que em toda a sua vida nunca desmamou, criou dois cachorros ... Baleia e Rex. Andava este casal de cães sempre juntos, caçando, correndo ou estragando a horta, latiam à noite para a lua cheia, e nunca tentaram fazer sexo entre si, por falta de paixão, diferença de tamanho, ou qualquer outra pulga.

Meu bisavô casou um dia depois do feriado de finados, alinhavou seu terno com fio de linha de outra cor, juntou os trocados que guardara em um cofre de barro. e com eles comprou duas garrafas de vinho, bebeu todo o vinho e com as garrafas vazias, matou os cães.

Minha avó nasceu dia três de três de mil novecentos e três, as três e três, de um parto difícil em que as parteiras, apenas três, se revezaram em crise de empurrões e empurramentos para fazê-la nascer, depois recolheram a placenta fosforescente e brilhante e com ela fizeram um luminosos barbante que até hoje esta esticado entre a cozinha e o banheiro no fundo do quintal, e a noite serve de guia para este trajeto entre a casa e os sanitários.Casou virgem com um rapaz do Leste comprador de garrafas,no meio das quais ambos foram encontrados pelo seu pai,copulando em paz.

Das tias que eu tive a mais querida foi Caetana, que morreu ainda muito moça, vitima da mistura de cremes e poções com as quais pretendia manter-se eternamente jovem.

Já tia Benedita deu a maior sorte, sua morte foi devida a grande onda de frio que varreu o Pará em 1934, dois anos antes de ela nascer, mesmo assim

comprou ações da Panair, e foi Diretora do colégio onde Jânio, iniciou a plagiar o dicionário de Buarque de Holanda.

Mamãe foi batizada e ainda de fraldas semidescartáveis foi lecionar em Sapé

Lá tio Edir e seu irmão Elzimar foram presos em Cabo Branco por ensinarem os tubarões e os saltimbancos, a pescar Arenque.

Não tiveram muita sorte, engolidos por uma Baleia foram encontrados pelos esquimós no Pólo Norte, e hoje são totens.

Eu os reconheci, por que os vi, em uma foto na mão de uma turista Argentina, moradora no bairro do Jurunas em Belém do Pará. De nome Mirassol Catalina. Era o ano de mil novecentos e sessenta e seis. Dai batizarem o anfíbio avião da FAB, de Catalina em sua homenagem, depois do passional crime, cometido contra ela, por um sargento que a amava. Que fugiu a nado para Cotijuba não chegou a ser preso e isso ficou por isso.

Muita gente nasceu na minha família e nem foram tantos, eu nasci um pouco adiante, quando Maluf asfaltou a Galiléia. Muita gente nasceu e não foram tantos, e não tão poucos e não tão importantes. Como o Homem Elefante e Elisabeth Taylor. Ainda, primos distantes, recordo... Herodes e o Alferes Tiradentes. E da descendência das filhas do meu tataravô, e dos primos do avô, e dos sobrinhos de minhas tias, Pele e Garrincha. De coisas famosas

realizadas pelos meus, guardo a letra de um hino composto por meu padrinho, para uma cidade descoberta por Cabral, duas ostras magrinhas

que imitam castanholas, uma pizza que quando se corta a borda, toca musica andaluz, e seis secas azeitonas pretas. E eu, que sobrei para fazer este relatório.

Que leio agora para a reunião centenária da família Ferreira.

Relatório para parcos ouvintes, entretidos, cada um em passar geléia em seu meio naco de pão, e tomar seu meio cálice de Rum. Cada um, com uma metade na mão e a outra metade na boca. Sentados como em uma grande Ceia.

Sisudos cenhos fechados de gorros e casacos de lã.

Todos em silêncio, ouvindo-me apatear sobre a mesa, descalço, fimosado e nu.

3 comentários:

  1. adoro literatura fantástica...temos então um representante no pará... alcides neves.

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  2. Alcides Neves, cantor e compositor nordestino,com varios discos, e uma tessitura musical que deve uni-lo aos maiores nomes da nossa MPB, muito me honrou escrevendo a apresentação do meu livro de contos 'Antena de Arame'.
    Obrigado.
    Em nome de Fernado Canto,e outros criadores culturais do Amapá.
    Intimo.Vá ao Amapá.Sentir-se-a em casa.
    Luiz Jorge.

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  3. Luiz Jorge, velho de guerra pegou o Ita do Norte e ja fazem muito tempo e foi em S Paulo morar,trabalhar,escrever... e não mais voltou o Ita do Norte não esperou

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