Conto de Ray Cunha
O tempo adormecia, morno, em Adrianópolis. Um
vulto branco, desfocado, tornou-se o vestido de uma criada no labirinto de
sebes erguendo-se do lençol de grama, aparado como cabelo recém cortado. Surgiu
uma mulher, que foi se sentar à mesa em que a criada servira o chá. Seus olhos
eram ligeiramente estrábicos; os lábios, quase indecentes, e tinha nariz
arrebitado. Esperava alguém, e supunha ouvir rumores. Movia vivamente a cabeça
e, no balé, os cabelos descobriam uma joia cintilando, a tremer junto ao
pescoço. Uma folha desgarrou-se, o vento levou-a, caiu na mesa, Tharcilla
apanhou-a e brincou com ela. A tarde era silenciosa naquele bairro de Manaus. A
criada foi avisá-la de que Al a esperava. Correu. No quarto, flutuava tênue
perfume. Al tocou-a. Ela respirou ofegante. Beijaram-se e o rapaz ficou muito
excitado. Era uma mulher bonita demais para ele. Desprendeu-se de Al e se
despiu. Depois deitou-se na cama. O púbis, negro, contrastava com o regaço de
Tharcilla, que chupava, absorta, um dedo. Fez um leve movimento com as coxas e
colocou mais um dedo na boca, agarrando com a outra mão os cabelos de Al, que
bebia sua calidez, as mãos imobilizando-a nos quadris, explorando-a até
deter-se nos seios palpitantes, ela arfando a se lamentar de prazer. Ingressara
num mundo onde as cores se confundem e as palavras se perdem nos murmúrios da
tarde.
A tarde foi publicado no livro A grande farra, edição do autor,
Brasília, 1992, 153 páginas, esgotado.
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