quinta-feira, 30 de julho de 2009

O TEXTO PREMIADO DO LÉO





Esta crônica foi publicada no jornal "O Liberal Amapá", logo após a morte do inesquecível amigo Leonardo de Almeida Vilhena, brutalmente assassinado em 22 de julho de 2002, em Brasília. Léo nasceu em Macapá em 06 de novembro de 1952. Era economista, professor, escritor (publicou dois livros de economia e contabilidade) e jornalista. A ele a nossa homenagem.


Leonardo de Vilhena, amigo de infância e de adolescência era um exímio marchador dos desfiles do dia da Pátria. Puxava pelotão do GM como só ele. Era disciplinado e muito aplicado. Na escola, só tirava notas altas. Um grande futuro estava reservado para ele. Mesmo tímido, Leonardo tinha um vasto círculo de amizades. Formou-se, à duras penas, como Bacharel em Economia e em Licenciatura em Geografia, em Belém. Trabalhou por anos com Planejamento no Governo do Amapá. Mestre em Orçamento Público pela Fundação Getúlio Vargas, tornou-se escritor e apaixonou-se pelo jornalismo. Começou novamente do zero: cursou Comunicação no Rio e foi lecionar jornalismo na UNB, onde ficou até este ano, quando viria para a UFPa.
Leonardo, o Léo, apesar de ter convivido com as tragédias de amigos, era um homem feliz. E mais feliz ficou quando ganhou o prêmio de Melhor Entrevista promovido pela Revista Imprensa, em julho de 1991. Léo publicou na Gazeta Mercantil o texto “Um Roxo não Presidenciável”, que transcreverei abaixo. Na sua dedicatória, falava que o texto era seu “primeiro prêmio jornalístico nacional”.
Da amizade das praças do Laguinho, por onde sonhamos o futuro do nosso povo, às farras no bairro do Trem, para onde se mudou com a família, até ao Rio de Janeiro e Brasília, onde nos encontramos por muitas vezes, ficou a marca eterna da admiração pelo Léo, um jornalista de talento que foi brutalmente arrebatado deste mundo, dez anos após o seu primeiro prêmio jornalístico. É inesquecível a frase que dizia à sua irmã Gracinha, quando chegávamos, a turma toda, para visitá-lo: “- Mana, o pessoal do Laguinho tá aí”.

Eis, então, o texto premiado de Leonardo Vilhena:

“UM ROXO NÃO PRESIDENCIÁVEL – Já passou pela sua cabeça que existem também outras pessoas com “aquilo roxo” e que sempre vão estar no anonimato? Pois é, Severino Alves dos Santos, igualmente alagoano, garante que a cor de sua virilidade é a mesma de seu famoso conterrâneo. Só que diz isso de uma maneira diferente. Severino é poeta de literatura de cordel e assegura: “Também tenho aquilo roxo / Mas famoso não vou ficar / O meu roxo é mais humilde / Eu sei bem do meu lugar/”. Nascido há 45 anos no município de Olivença, em Alagoas, “terra dos chegantes, dos passantes, dos retirantes e dos poucos edificantes”, Severino, aos 10 anos, já estava no Rio de Janeiro, na luta pela sobrevivência. Casado com a prima Maria das Dores, 7 filhos, morando no bairro de Santíssimo, zona oeste, ex-pedreiro de construção civil, atualmente é ascensorista do Edifício França na Av. Presidente Vargas. Simpático, comunicativo, envolvente, Severino è aquele tipo “figura” que as pessoas costumam dizer: “Se você não existisse teria que ser inventado”. Para Márcio Batista, estagiário de um escritório de engenharia no 8º andar do Edifício França, o ascensorista é a sabedoria personificada. “O Sevé é meu amigão. Quando estou com problemas ele me dá conselhos muito úteis”, afirma. São conselhos, receitas, simpatias, orações, sugestões, horóscopos, opiniões meteorológicas, palavras de apoio e carinho. Enfim, o conselheiro-mor do prédio. Cláudia de Almeida, secretária no 11º, lembra que num determinado dia de verão, às duas da tarde, elevado lotado, todos calados, mal humorados, pingandos de suor. Severino arrisca: “É uma frente fria que veio lá do Ceará”. Gargalhada geral.
Apesar de ter apenas o primário incompleto, Severino se expressa com desenvoltura e com um vocabulário de fazer inveja a muito letrado. Um detalhe: é leitor assíduo da Gazeta Mercantil e discute finanças como ninguém. Cristina Toledo, economista de uma financeira no 10º andar, adora discutir novas medidas econômicas com Sevé e não lhe poupa elogios. “Ele tem um senso crítico muito apurado, é inteligente, perspicaz e de um poder de síntese impressionante”, afirma com carinho. Ainda sobre economia, Severino é fã ardoroso da ex-ministra Zélia. Admirava a personalidade forte e a coragem com que enfrentava os grandes cartéis, que segundo ele, ainda são os responsáveis pelo caos na economia brasileira. E no sobe e desce do elevador improvisa ao novo ministro: “Ministro Marcílio, eu lhe peço / Acabe logo com a inflação / O povo não agüenta mais / De tanta judiação / Vamos acabar morrendo / Todos de inanição”.
Os versos do poeta também têm seu lado erótico – quase pornô – que se manifesta às sextas-feiras, durante os chopinhos após o expediente. Aí a inspiração libidinosa vem à tona. Para aquela moça bonita que vai passando, Sevé ensaia: “Menina casa comigo / Que não morre de fome / Lá em casa tem uma pinta / Nós dois mata e nós dois come / De dia tu come a pinta / De noite o pinto te come”. A erotização aumenta na mesma proporção dos chopps tomados. Os bons companheiros das “saideiras” garantem que alguns versos são verdadeiras obras primas e que mereciam constar de uma antologia de poesia erótica. Ninguém duvida.
Mas Sevé não é nenhum Don Juan. É notória a fama de Das Dores que, discretamente, o mantém sob suas rédeas. Aliás, Severino faz questão de ressaltar que a fidelidade conjugal é uma de suas qualidades. “A patroa é a minha cara-metade, me completa em todos os sentidos”, garante.
Voltando à cor ora em moda, Severino acha que se fosse ele que saísse por ai dizendo que tem “aquilo roxo”, seguramente iria ser chamado de vulgar, grosseiro, Paraíba e assim por diante. Mas como foi “Ele” que falou, a coisa virou modismo e qualquer dia vai ser tema de mini-série na Globo. Meio magoado, de brincadeirinha avisa: “Vou deixar de ser poeta / Não vale a pena não / Se o “Homem” pode tudo / E vai pra televisão / Os meus versos so servem / Para fazer figuração / Tudo está me deixando / Sem nenhuma inspiração”.
Um “figuraço”, sem dúvida! (Leonardo de Vilhena).”

quarta-feira, 29 de julho de 2009

ESTRADA DO TEMPO

Eis que o tempo bate. Implacável.
Mas lembranças são raios que iluminam a memória
De um tempo que fomos para sermos o que somos
Veja aí. O conjunto “Famber”, do antigo Grêmio Jesus de Nazaré.
Ano: 1970. Local: Rua Leopoldo Machado com Avenida Mãe Luzia.
Ao fundo a casa do seu Winter, hoje famosa sorveteria Jesus de Nazaré.
Personagens: Bi Trindade (voz), Fernando Canto (contrabaixo), Edmilson “Pianola” e Manoel Jacson Amorim Coelho (guitarra),
Tempo da calça justa e sapato “conga”. Lá atrás duas “pequenas” passantes.

Foto: Acervo de Fernando Canto


segunda-feira, 27 de julho de 2009

O SENTIDO DAS MÁSCARAS DE MAZAGÃO

Alinhar ao centroAs Caraças (foto) utilizadas pelos "Máscaras" na festa de São Tiago, em Mazagão Velho, são confeccionadas com papel de revistas e jornais, goma de tapioca e tintas diversas (inclusive de urucum e de esmalte de unhas), tipo papel marchê. Hoje são poucos os artesãos que ainda fabricam estes artefatos, em razão da facilidade de aquisição de máscaras industrializadas para o carnaval. Foto: Fernando Canto

Há alguns anos ministrei palestra para uma turma de Sociologia do Ceap sobre "Cultura e Poder", enfocando aspectos da Festa de São Tiago de Mazagão Velho, a convite do professor Luís Alberto Guedes. Nesse dia levei uma caraça utilizada pelos "máscaras" e pedi aos alunos que a experimentassem em seus rostos. As reações foram as mais diversas e a discussão bem participativa.


Entretanto, se por trás da máscara há um mundo de significados, pela frente pode representar a face divina, a face do sol. Ela exterioriza às vezes tendências demoníacas (Teatro de Bali, máscaras carnavalescas), manifesta o aspecto satânico. Ás vezes não esconde, mas revela tendências inferiores que é preciso por a correr, porque não se utiliza uma máscara impunemente. Ela é um objeto de cerimônias rituais, como por exemplo, as máscaras funerárias, que são arquétipos imutáveis nas quais a morte se reintegra. Na China ela se destina a fixar a alma errante. Também preenche a função de agente regulador da circulação das energias espirituais espalhadas pelo mundo e visa controlar e dominar o mundo invisível.


Na Festa de São Tiago ela é usada no "Baile de Máscaras" que ocorre no dia 24 de julho, e é um dos aspectos ritualísticos mais importantes, pois simboliza uma cena de regozijo à vitória que os mouros julgavam ter obtido sobre os cristãos. O baile ocorre após terem oferecido comida envenenada a eles, visando dar oportunidade aos que quisessem passar para seu lado. É um baile de homens onde todos estão fantasiados, mas às mulheres e crianças é proibida a participação. Eles dançam no sentido inverso ao do relógio até ao amanhecer.


Ao meio-dia um personagem mascarado chamado "Bobo Velho" passa três vezes no território cristão e é apedrejado pela assistência, pois se trata de um espião mouro tentando obter informações. Na cena do "Rapto das Criancinhas Cristãs", os "Máscaras", dezenas de atores populares, surgem fantasiados, assustando e arrebatando olhares de medo das crianças que os assistem.


A máscara parece ser uma transferência de energia que tem o sentido de mutação e que transcende o drama. Já o "Baile" é uma festa dentro da festa. É uma cena de um drama em que paradoxalmente ocorre a oportunidade de se desregrar (pela ingestão do álcool). Mas é quando se subverte a realidade constituída, pois a organização social do drama tem seus apelos e sanções: se há notícia de outra festa na vila, os "Máscaras" vão até lá e acabam com ela. Fazem respeitar as normas da tradição e tecem críticas à realidade através de um grande boneco mascarado chamado "Judas", que todo ano muda de nome, conforme o momento histórico e a decisão dos que o confeccionaram.


O "Baile de Máscaras" é uma forma de representação do potencial subversivo das festas, não só pela crítica, mas pelo dançar constante na direção inversa ao do ponteiro do relógio, tratando-se de um embate contínuo com o tempo, quando os brincantes giram e vão se espiralando, afastando o tempo linear e vivendo a dimensão da memória, num tempo mítico, onde os acontecimentos heróicos se repetem pelos rituais.


Culturalmente as máscaras de Mazagão Velho podem ser vistas como um aspecto místico da festa porque traduzem o tempo, a memória e o ritual que organiza a memória, a história e a sobrevivência da sociedade. Assim a cultura da festa se efetiva porque suas crenças, gestos e valores são oriundos de um processo de criação de homens e mulheres e que são partilhados por todos, por meio de juízos de valor e símbolos.


A utilização da máscara na Festa de São Tiago é de disfarce, de aparência e de jogo estratégico. E para entender melhor esse processo nada como pôr no rosto uma caraça, pois assim cada um assumirá também o papel que subverte e mete medo, e que também diverte, mas, sobretudo, que une e corporifica os valores culturais daquela sociedade.


sábado, 25 de julho de 2009

Pesquisadores e incentivadores da Festa de São Tiago


Professora Zaide Soledade, sua filha Socorro e a historiadora Decleoma Lobato


Professor Munhoz Lopes e minha amiga Cristina Homobono, a quem parabenizo pelo seu aniversário recém-comemorado em sua residência em Mazagão Velho.
Fotos: Fernando Canto

A Tradição da Festa de São Tiago em Mazagão Velho – Estado do Amapá


Figuras representativas de São Tiago e São Jorge


Imagem de São Tiago Matamouros

Círio de São Tiago pelas ruas da Vila de Mazagão Velho
Figura do Menino Caldeirinha, príncipe mouro
Fotos Fernando Canto/2005

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Presente de meu amigo Juraci Siqueira



Recebi hoje, pelo correio, este maravilhoso presente do escritor Juraci Siqueira, editado pela Secult/Seduc/Amu-PA, em 2007. Há um verbete sobre a minha obra musical e literária. É uma honra.
Quero agradecer a lembrança do insigne folclorista, musicólogo e antropólogo Vicente Salles, prefaciador de meu ensaio "A Água Benta e o Diabo", e companheiro de inúmeras viagens de pesquisas musicais pelo interior do Pará, na década de 1990.
Devo informar que o volume em tela também traz verbetes sobre o Mestre Oscar Santos e o músico Joãozinho Gomes.


"Canto, Fernando Pimentel. Poeta, prosador, músico e compositor. Óbidos/PA, 1954. Viveu a infância e juventude em Macapá, dedicando-se ao jornalismo, à literatura e à música popular, participando de festivais e integrando o grupo Pilão. Bacharelou-se em Ciências Sociais pela UFPA, com especialização em antropologia. Professor na UNESPA e assessor do Núcleo de Artes da UFPA. Participou de várias antologias e lançou: Os Periquitos Comem Mangas na Avenida (poesia),São José de Macapá: Roteiro poético, Evandro Salvador: Artigos, contos e poesias (organizador), Telas e Quintais (crônicas e textos culturais sobre o ex-Território Federal). Exerce o magistério e atividades culturais em Macapá, dedicando-se ainda à pesquisa e estudo da cultura popular, em especial das comunidades negras do Curiaú e Macapazinho."

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Aniversário de Nonato Leal - 82 anos de puro talento musical


Lembro do primeiro contato que tive com esse incrível e generoso músico no final dos anos 70, quando iniciava por conta própria a aprender violão. E foi num dia de Festival Amapaense da Canção, sob a frondosa mutambeira do grupo escolar Barão do Rio Branco que Nonato me viu e me deu a dica de uma passagem de tom na música que eu executava. Depois ele adentrou o ex-cine Territorial para ensaiar sua composição que seria a vencedora do festival, em parceria com o inesquecível poeta Alcy Araújo.



A modéstia do violonista é conhecida por todo mundo junto ao seu inominável talento que atravessou décadas encantando os mais diversificados públicos que tiveram a oportunidade de ouvir seu trabalho. Requisitadíssimo, Nonato Leal jamais se furtou a um bom convite para tocar, pois sempre soube se valorizar, embora nas rodas boêmias fosse um integrante como qualquer outro bom bebedor, um companheiro divertido que nem ao menos se zangava com as piadas que faziam sobre sua terra natal e lhe insinuavam ser o protagonista principal. Vigiense de boa cepa, até hoje adora um bom caldo de cabeça de gurijuba, ao qual atribui ser afrodisíaco, e a fruta do cedro, parecida com o taperebá, que considera o melhor tira-gosto para a cachaça.



Sua participação no crescimento da nossa música foi determinante. Nonato tocou em diversos grupos musicais, ao lado de instrumentistas famosos como Sebastião Mont'Alverne e Amilar Brenha, Hernani Guedes, Chico Cara de Cachorro e Zé Crioulo, Aimorezinho, Manoel Cordeiro e tantos outros. Tocava qualquer instrumento de corda: foi o primeiro artista do Amapá que vi tocando guitarra havaiana. Participou da gravação do LP "Marabaixo" do conjunto "Os Mocambos", em 1973. Seu programa de rádio "Recital de Nonato Leal" por anos teve audiência assegurada nas rádios de Macapá. Mas foi como professor que disseminou o amor pela música a dezenas de discípulos que hoje ganharam o rumo da profissionalização musical, incluindo aí seus filhos Venilton e Vanildo Leal. Seu primeiro CD "Lamento Beduíno", editado em 1997, com arranjos de Manoel Cordeiro, esgotou-se rapidamente. Nesse trabalho tive a honra de escrever um texto a pedido dele, do qual reproduzo o primeiro parágrafo:



"A saudade de Macapá me fez sintonizar ao acaso a Rádio Neederland em uma noite fria e triste em Belo Horizonte no ano de 1974. De repente um solo de violão me chamou a atenção. Tratava-se de uma música com temática oriental, muito bonita e bem executada, chamada "Lamento Beduíno", do professor Nonato Leal, de Macapá, Território Federal do Amapá, Brasil, dizia o locutor daquela rádio holandesa. Vibrei! Coincidência ou não a história mudou meu astral e motivou um porre de pavulagem bairrista. Pena que ninguém que eu conhecia tivesse ouvido o programa. Tempos depois soube que fora o radialista Edvar Motta que enviara uma fita com músicas do Nonato para lá".

Na foto, Nonato Leal e Aymorezinho, no Bar do Abreu

terça-feira, 21 de julho de 2009

21/07/1899 – Nasceu Ernest Hemingway

Ernest Hemingway foi jornalista e escritor norte-americano. Em 1916, como repórter, alistou-se no exército italiano sendo gravemente ferido em batalha. Ao deixar o hospital se tornou correspondente em Paris e lançou o livro "O Sol Também Se Levanta", seu primeiro grande sucesso. Em 1929, publicou "Adeus às Armas", onde descreveu sua experiência militar na Itália.
Em 1932 foi para a Espanha, onde produziu "Morte à Tarde", sobre as touradas; participou de caçadas na África Central, que foram relatadas em "As Verdes Colinas da África", de 1935; participou da Guerra Civil Espanhola e escreveu "Por Quem os Sinos Dobram" em 1940; de suas experiências como pescador em Cuba, surgiu, em 1952, "O Velho e o Mar", livro que lhe rendeu o Prêmio Pulitzer.
Hemingway foi ainda ganhador do Nobel de Literatura em 1954. Em 1961, o autor se suicidou em sua casa nos EUA.

Disponível em www.igeduca.com.br

AMIZADE ESSENCIAL


Graças a Deus sempre tive muitos amigos: de infância, de escola, de bar, amigos que fiz no decorrer de uma vida cheia de altos e baixos e que sempre pude contar com eles nas horas que precisei. Até porque "amigo é pra se guardar no lado esquerdo do peito", como disseram o Fernando Brant e o Milton Nascimento. Não se têm amigos só para jogar conversa fora, brindar em uma comemoração ou para fazer (in)confidências, às vezes mentirosas e desnecessárias. Nesse caso sempre a amizade vai por água abaixo quando se vê um segredo traído e, pior, espalhado pelos sete cantos da cidade. Já tive "amigos" que supus serem Amigos, que ajudei pensando estar fazendo um bem, e que a ingratidão deles brotou como espinhosa árvore na lavoura que tentei cultivar.


Não falo de inimigos, pois como os ex-amigos, eles não merecem a minha ira. Apenas desprezo o que não quero prezar. Eles são meramente pontos obscuros de referência na encarnação de um maniqueísmo torpe, trivial e vulgar. Amigo mesmo é para contar com ele na hora da necessidade, para se divertir, criar junto e imaginar um mundo melhor para os que nascerão. È o protótipo de nossa própria utopia.


Talvez fosse desnecessário este preâmbulo para falar de gente que gostamos de graça e nem fosse conveniente registrar numa crônica o apreço que sentimos por certas pessoas que às vezes, por gestos naturais e descomprometidos, nem sabem a extensão do bem que fizeram a nós em determinados períodos de nossa história pessoal. É verdade que nesse caminhar encontramos amigos dos amigos que não são nossos amigos, mas que os toleramos por respeito à admiração pessoal ao amigo titular. Assim também é verdade que falseamos nossa conduta para não decepciona-lo, embora acreditando que de falso em falso se chega ao cadafalso.


Machado de Assis dizia em "Ressurreição" que o tempo não conta para a amizade: "Que importa o tempo? Há amigos de oito dias e indiferentes de oito anos". Talvez o tempo seja o que conta para quebrar os obstáculos, pois ele "é o único caminho que rompe o inacessível absoluto", no dizer da filósofa espanhola Maria Zambrano. E dizem que muitas amizades que se rompem, um dia voltando, passam a ser mais do que eram independentemente das diferenças do passado. Voltam mais sólidas e mais maduras. E passam a ver que sempre existiu alguém interessado nesse rompimento. Coisas de novela.


Pessoas que estimamos passam por provações e se tornam sábias sem saber se são, ou pelo menos não demonstram isso. Há as que têm as almas simples e vivem num mundo aparentemente sofisticado. Mas as almas dos amigos muito se assemelham a casas: algumas delas são cheias de janelas abertas, onde corre ar puro e luz, outras são como prisões, fechadas e escuras, mas que merecem nossa consideração e respeito, porque a alma entende-se a si mesma e o amigo vale a afeição que fazemos valer por ele. E Uma alma, mesmo fechada, sempre traz uma luz que pode nos iluminar e banhar-se a si própria.


Amigos têm defeitos e mazelas. Por essa imperfeição mútua é que normalmente amizades se atraem, bem como pela admiração recíproca de cada desempenho social. Uns moldam outros, outros se espelham em alguém. Mas na amizade só não pode existir a incorporação da personalidade do amigo. Deve haver o respeito à solidão e ao silêncio do outro. Espíritos amigos voam na mesma direção da fonte original e bebem da mesma água fresca. Devem saciar sua sede bem antes que ela seja poluída pelos interesses pessoais de qualquer conspirador. A amizade só é possível pela oportunidade.


Imagem extraída do livro "Sobre o Tempo e a Eternidade" de Rubem Alves. Ed. Papirus. São Paulo, 1996

segunda-feira, 20 de julho de 2009

PARABÉNS MINHA FILHA


Parabéns Julia, pelo seu aniversário.



JÚLIA


Minha dor não lacrimeja
Sangra
Salga sofre e sobrevive
como o pássaro amazônico
Minha saudade é doída
É doida
É longa e viva
mesmo ao im(pacto)
da roda morta
das horas
Minha saudade rosna por aí

É uma saudade cega
seca e chuva
Minha saudade é uma cidade

grande
obesa, depravada
e noite


É uma saudade gasta
É uma saudade jade
É uma saudade Júlia

Publicado no livro "Os Periquitos Comem Mangas na Avenida". Macapá, 1984. Poema musicado por Joel Elias e gravado por Sabatião

A MORTE E O ESPANTO



Mircea Eliade conta no seu livro "O conhecimento sagrado de todas as eras" que há quatro tipos de mitos sobre a origem da morte. Um deles é o tipo da serpente e sua pele eliminada, da Melanésia.

Esse mito fala que no começo os homens nunca morriam, entretanto ao atingir certa idade eliminavam a pele como as cobras e os caranguejos, e novamente ficavam jovens. Reza o mito que certa vez uma mulher que estava ficando velha foi a um regato para mudar de pele. Ao se desfazer da pele velha, lançando-a à água, notou que a pele foi levada pela corrente, mas que ficou presa em um galho seco. Depois voltou para casa onde tinha deixado o filho. Este, contudo, recusou-se a reconhecê-la, e disse chorando, que sua mãe era uma velha, diferente dessa jovem estranha; e assim, a fim de acalmar a criança, a mãe voltou ao regato em busca de seu tegumento eliminado e vestiu-o novamente. Desde então os seres humanos deixaram de eliminar a pele e começaram a morrer.


A explicação do nascimento da morte em todas as culturas é sempre seguida pelo inevitável encontro com ela e pela explicação da imortalidade da alma humana, alma que ela introduz aos desconhecidos mundos dos infernos e dos paraísos. Ela é a filha da noite e irmã do sono, por isso possui como a mãe e o irmão o poder regenerador. Se o ser que ela abate vive apenas no nível material ou bestial, ele fica na sombra dos infernos; se, ao contrário, ele vive no nível espiritual, ela lhe revela os campos de luz.
Desde que nascemos convivemos com a morte. Há uma permanente tensão por não sabermos nem como nem quando pereceremos. Enquanto isso vamos alimentado os mais diversos símbolos para espantá-la do dia-a-dia ou procurando formas de chegar ao paraíso, onde seremos recompensados pelo que fizemos de bom. Mas também cultuamos forças maléficas e procuramos incessantemente a imortalidade.


Os símbolos da morte estão presentes em todos os lugares e em todos os níveis de existência nessa tensão permanente entre as forças contrárias da vida e da morte. Desde crianças convivemos com ela, através de representações iconográficas de caveiras, túmulos, personagens vestidos com um manto negro e armados de foice, serpente, cavalo, cachorro ou outros animais psicopompos (condutores das almas dos mortos, na mitologia grega). Todos nós convivemos com riscos e contamos nossas histórias depois de passadas as tensões; tentamos evitar esse flagelo de muitas formas, principalmente com as novas descobertas da ciência, e pensamos em enganá-la sempre que sentimos sua presença, como nas histórias de cordel.


Entretanto conviver com ela significa conviver com a realidade; denota estar dentro de um mercado amplo e indiferente aos sentimentos, com todas as suas mazelas e artimanhas. Morremos um pouco quando os entes queridos partem e sofremos ao compartilharmos nossas dores com a perda de amigos, de ídolos e de nossas referências pessoais.


O sonho da morte e a realidade da vida - e vice-versa - trazem dentro de cada ato findo um pouco da poesia daquilo que parte, que renasce como um caminho para uma nova aventura da vida. Não a poesia funesta, a tristeza fúnebre, a fantasia gótica, mas o enleio, o espanto, a sombra perdida na floresta que volta para o corpo em forma de alma. Sim aos despojos da pele da serpente, renovada na jovem mulher que o filho não mais reconhece como sua mãe.


Ah, a imersão de Dante na Divina Comédia, a descida de Orfeu aos infernos para resgatar a alma de Eurídice, sua bela esposa; Gilgamesh em sua epopéia em busca da imortalidade e a descida de Ishtar, deusa da vida e da fertilidade, ao mundo inferior.
O mito, o sonho da imortalidade, a explicação na lógica de cada cultura fundem-se na abstração que ora faço enlevado pela imagem de um corpo sem sombra – a alma assombrada, que vi num tempo de espanto, de maravilha, e de afugentação. Então: "Vai-te daqui, ó Morte, segue teu caminho especial separado daquele que os deuses costumam trilhar./ A ti que tens olhos e ouves, digo: não toques em nossos descendentes, não magoes nossos heróis". ("Rig Veda", X, 18).


Publicado no jornal "A Gazeta", 19 e 20/7/2009

sábado, 18 de julho de 2009

18 JULHO - DIA DO TROVADOR





Homenagem ao grande poeta e trovador Juraci Siqueira (www.blogdobotojuraci.blogspot.com) com a trova que abre seu Blog do Boto:

NÃO TIRE FÉRIAS DA VIDA

Curta o mundo sem atalho,
com cuidado, sem corrida;
tire férias do trabalho,
não tire férias da vida!!!


O surgimento do nome da Trova está intimamente ligado à poesia da Idade Média. Durante a Idade Média, Trova era o sinônimo de poema e letra de música. Hoje a Trova possui a sua conceituação própria, diferenciando da Quadra e da Poesia de Cordel, e do Poema musicado da Idade Média. Trovadorismo foi a primeira escola literária portuguesa. Esse movimento literário compreende o período que vai, aproximadamente do século XII ao século XIV.
www.geocities.com/clerioborges/trovadorismo.html

Poema na Areia



Poema escrito na areia da praia que surge na maré vazante, no meio do Rio Amazonas, do outro lado da Ilha de Santana - AP. Passeio em família realizado em dezembro de 2002.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

SACO DE FRASES

Cresci num bairro segregado na geografia da minha cidade em formação. Era um local de densas matas e lagos de águas verdes abundante de aningas e buritis. Enquanto nossos pais trabalhavam nas repartições públicas, nós, crianças, jogávamos bola nas ruas empiçarradas, ou caçávamos com tiros certeiros de baladeiras os pobres passarinhos. Crianças implacáveis!

Entre as aulas e as brincadeiras, porém, eu andava pela doca da fortaleza, e pelas ruas do comércio vendendo jornais, escutando histórias e as aspirações das pessoas. A cidade tinha grandes esperanças. Mas de vez em quando eu ouvia vozes reclamantes tirarem seus lençóis sujos e descobrirem seus ranços pelos coaradores dos quintais: "caboclo preguiçoso", "velho caduco" "Japonês é traiçoeiro", "juiz ladrão", "branco ensebado", "preto retinto do Laguinho", "mulher burra", "arigó assassino", "prefeito ladrão", "judeu sovina", "índio fedorento", "moleque safado de uma figa", "todo político é corrupto", "puta escrota", "libanês esperto". Pessoas se xingavam, se machucavam.

Um dia comecei a ordenar essas frases e perguntei a uma freira o que significavam. Ela pediu que eu escrevesse uma a uma em pedaços de papel de embrulho, que as pusesse num saco e que o levasse até a lixeira para queimar. No trajeto o saco foi ficando cada vez mais pesado e eu sem forças. Só consegui arrastá-lo. Mas ele foi se gastando e se rasgando e algumas das frases saíram pelo rasgo e se perderam voando com o vento. Ao chegar à lixeira o saco estava leve. Só consegui incinerar umas poucas.

Hoje, quando percorro pelo antigo local da lixeira, sempre espero que o vento deixe pousar na minha frente uma daquelas frases escritas para que eu possa queimá-la, e assim extirpar do universo mais um preconceito que eu não deveria ter tido na caminhada da vida.

Publicado no livro EquinoCIO – Textuário do Meio do Mundo, Ed. Paka-Tatu, Belém – PA. 2004 e utilizado no vestibular da Universidade Estadual do Amapá, em 2008.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

HOSPEDEIRO DA NOITE PREMATURA

"No princípio eram pedras e paus. Então inventaram a lança, a funda, a flecha ..."


10
Mais brilhante que um cometa

da Europa surgirá um míssil

anunciando a vinda dos Quatro Cavaleiros

O espetáculo de fogo enseja

a renatividade de um Cristo confuso

entre dez mil estrelas desguiadas

e reis desintegrados no deserto

"Na batalha de Adrianópolis, no ano de 378, a cavalaria visigoda e ostrogoda dizimou as legiões romanas: 40 mil mortos".

9

Genebra é a capital da atenuação

Olhares antípodas se cruzam

e o mundo suspira de alívio

ligado nas cenas de sorrisos

e apertos de mãos

"A infantaria cedia lugar ao homem montado, uma arma dominaria os campos por séculos".

8

Homens e santos politizam gestos

privatizando o que não lhes pertence

Qualquer merda será lucro

escatológico

na proliferação dos cientistas

que criam os meios

e combatem os fins

Oh infeliz essência de evidência!

Lixo humano

poluindo inteligência

"Em 1139, um édito do Vaticano proibiu o uso da besta, exceto contra muçulmanos. Ela era capaz de penetrar uma cota de malha a 150 metros."

7

Dialogaram cuspindo painas

ao vento do inverno inadiável

o ponto convergente foi a certeza:

- Após a bomba a dor acabará.

Homens e robôs transformam a terra

fabricando ogivas

como quem fabrica filhos

Os arsenais se multiplicam

e as conversações aumentam

Quem sabe mesmo

são os intérpretes

(enclausurados nos segredos)

"No século XIV, o uso de canhões tornou inúteis os castelos e seus torreões. A pólvora deu impulso à busca de armas capazes de atingir o inimigo com maior rapidez e impacto".

6

Corre ocidente

Corre oriente

Corre boiada humana

Correm megatons

Cidades desenganadas

Desfile de dentes brancos

Sádicas gargalhadas

Maratonas de instrumentos

Botões e temperamentos

Quem ganhar tem como prêmio

O fogo desesperado

Do mito de Prometeu

"Um avanço simples – converte de rombuda para pontuda a extremidade da bala – tornou o fuzil uma arma extremamente mortal: 86% das baixas da guerra civil americana foram provocadas por fuzis".

5

A Paz é uma atividade guerreira

Inda que por meios mais obsoletos

o homem fere e vaza

os olhos do inimigo

Por trás do ódio absoluto

há um claro e louco canto

Agônico

Do homem

Hospedeiro da noite prematura

"O gás penetra em qualquer refúgio, o avião tornou desprotegido qualquer exército".

4

O sonho dos alquimistas

a doce ilusão de Dumont

se volatizam no ar-nada

No coletivo sufoco de Bhopal

No cheiro esdrúxulo da morte

mais que anunciada

por poucos preservadores da raça

Chernobyl, Chernobyl

Protótipo da noite longa

A noite dos fragmentos

noite dos fragmentos

dos fragmentos

fragmentos


"Mas foram criadas armas antitanques, máscaras contra gases, mísseis que derrubam aviões".

3

Presidentes, reis, xeiques, aiatolás

miram botões

Coçando as mãos

Antes, porém, fazem os tratados

Acordos e convenções

- pactos caros -

E louvam os desarmamentos

Dos outros, dos menos fortes

Os botões, sem vida, permanecem

à espera do aperto inconseqüente

Nações ardem em desespero

à revelia do último momento

Pela liberdade que definha

e por seus deuses que fugiram

"As armas nucleares elevaram a potência de impacto a níveis extremos, o uso de foguetes permitiu vencer a distância e a eletrônica tornou a precisão melimétrica"

2

Bomba, bomba

Excrescência da ciência

O tumor sem cura

Letal veneno que o saber

humano

jamais fabricou

  • Que mentiras devassam

o gênero do homem

e a evolução da espécie?

A doutrina armamentista

a oficina da destruição

ou o cinismo deflagrado

antes das armas

"Da besta ao míssil nuclear, a história da corrida armamentista é uma seqüência de 'últimas armas' sendo sobrepujadas pela seguinte, mais letal".

1

Como no Japão

Three Mile Island, Goiânia, Chernobyl

New York, New York, quem sabe Rio ou Tumucumaque

vivemos a iminência do perigo

a certeza do risco

e a ausência dos abrigos

O homem

- o hospedeiro da agonia

o mesmo fabricante das ogivas

pedirá clemência a ele próprio

quando a negação da raça

for a tônica primordial

do genocídio absoluto

"Uma arma, enfim, que colocará fim a todas as guerras".


FOGO!!!


Pesam, contudo, todos os avisos

a mão do ecologista

a graça

das crianças

o poema e a esperança

No outro lado da balança

treme, inexplicavelmente

a Gênese mal começada

ao som do Apocalipse...


Belém, 1987



N. A. As frases que antecedem os poemas foram retiradas do texto "Corrida Sem Fim da Arma Total" (revista ISTOÉ, de 20.11.85)

quarta-feira, 15 de julho de 2009

DUPLO ARCO-ÍRIS



Um arco-íris duplo, lindo. O céu inundado de cores. Um espetáculo da natureza.

Publico esta imagem captada da janela de nossa casa para dar boasvindas ao Fernando que retorna hoje de Óbidos-PA. (Sônia Canto)

terça-feira, 14 de julho de 2009

O Marabaixo de 1898



O jornal “Pinsonia”, primeiro periódico a ser impresso e a circular em Macapá, provavelmente de 1895 a 1900, traz em sua edição de 25 de junho de 1898 um artigo anônimo denominado “Mar-Abaixo”.

Julgo que se faz necessário mostrar aos pesquisadores e leitores a visão da época sobre o folclore local, uma visão de aversão às manifestações populares, de caráter racista e discriminador. Na época o “Pinsonia” era propriedade do deputado e Redator-Chefe Mendonça Júnior, que não se encontrava na cidade, conforme o “noticiário” de primeira página em que o jornal diz ter recebido carta dele através do vapor “Pedro 2º”, no dia 17 do corrente. O Diretor-Gerente era o tenente-coronel José Antônio Sequeira, que como o seu chefe, virou nome de Rua em Macapá.

O texto, ipis litteris, é o seguinte:

“Até que afinal desapareceo o infernal folguedo, a dança diabola do Mar-Abaixo; serà uma felicidade, uma ventura, uma medida salutar aos órgãos acústicos, se tal troamento não soar mais, senão nas profundezas da terra, nos subterrâneos onde moram monstros, capazes de supportar tamanho ribombo de estravagante musica para meneio immoral e nojento”.
“Graças ao Divino-Espírito Santo, symbolo de nossa santa religião, que só exige a pratica das bôas acções, não ouviremos os silvos das víboras que dansam ao som medonho dos gritos dos maracajás, que ao mesmo tempo batem com as patas, produzindo barulho que faz arripiar as carnes, e os cabellos, que é sufficiente a provocar doudice á qualquer individuo”.
“O nosso primeiro artigo á respeito deu no gôto de muita gente boa, que dá alma vida e coração pelo tal brinquedo; deu-lhe no gôto, mas negativamente, pois não comprehendera o sentido da linguagem, toda moralisada, toda doutrinal, toda civilizada”.
“Alguém desesperou-se com a nossa licção de moral, a ponto de atirar apôdos ao nosso Director, que de coração bem formado, não negará misericórdia aos pobres de espírito”.
“Que o MAR-ABAIXO É INDECENTE, É O FÓCO DAS MISÉRIAS, O CENTRO DA LIBERTINAGEM, A CAUSA SEGURA DA PROSTITUIÇÃO, ASSEVERAMOS”. (grifo nosso)
“Que os paes de famílias não devem consentir as suas filhas e esposas freqüentarem tão inconveniente e assustador espetáculo DESSA DANSA, ORIUNDA DOS CAFRES, (grifo nosso) aconselhamos, para darmos bello, edeficante e moralisador exemplo de civilização, para demonstrarmos que enchergamos alguma cousa”.

Não nos foi possível identificar o autor desse artigo, mas ele mesmo cita que o seu primeiro texto a respeito do assunto, “deu no gôto de muita gente boa, mas negativamente”, e que seu diretor foi objeto de zombarias. É importante notar que o articulista moralista fala da “estravagante música para MENEIO immoral e nojento” e afirma que o marabaixo é a causa de todos os males daquela sociedade de outrora. Evidentemente que a situação deve ser contextualizada para uma análise melhor do fato, por isso considero esse texto mais que um desafio para pesquisadores. É uma viagem no tempo.

Em 31 de maio de 1899, edição nº116, o jornal traz o texto “Festa do Divino Espírito Santo”, assinado por Pancrácio Júnior (possivelmente pseudônimo de Mendonça Júnior), no qual elogia o festeiro e Juiz da festa Dr. Raimundo Álvares da Costa, faz interessantes descrições de alguns dos seus aspectos, mas se revolta com a ausência do cônego Teixeira, contratado para as solenidades da igreja e que vinha munido de portaria do governo do bispado e que desistira no último momento.

Mas essa já é outra história.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

A MÚSICA ABRIU O BAR


Osmar Júnior, festejado cantor e compositor, reuniu amigos e admiradores na FAB, no final de junho para lançar seu CD do Bar do Abreu. O artista freqüenta o local há mais de duas décadas, sendo um acompanhante emérito do antigo bar itinerante e agora ponto boêmio mais tradicional da cidade.

De Zito Borborema trouxe de volta o sucesso dos anos sessenta “Ilha do Marajó”, aquela do “recebi um telegrama do meu velho pai/ me pedindo pra voltar”, que todos, surpreendentemente, sabem cantar por inteiro. Regravou “Pedra Negra”, do Grupo Pilão (Fernando Canto), com excelente arranjo e solo de guitarra do Cleverson Baía, interpondo um grito de indignação contundente no final da interpretação. Trouxe de volta composições suas, já gravadas, como “Kizomba”, “Pedra do Rio” e “Tarumã das Estrelas” e outras inéditas como “A Morada do Topo do Mundo” e “Sabiá Saudade”, além de “Blues Vinha D’alho” em parceria com o compositor paraense Walter Freitas e “A Brasileira” com Ronery.

A competência artística de Osmar jr. não se enquadra naquilo que equivocadamente chamam de regionalismo musical. Suas composições me parecem um esforço que procura extinguir o equívoco impregnado nesse rótulo.

A prova disso são as canções inclusas nesse CD, gravado ao vivo, onde o artista se expressa através de uma variedade de formas musicais de diferentes compositores e encontra o aplauso do público boêmio freqüentador do conhecido bar macapaense. Nesse trabalho o cantor-compositor se despoja de requintes para encontrar uma platéia fiel e contemplar no sorriso de seus fãs a satisfação de vê-lo cantando samba, marabaixo, xote e outras cantorias que a noite requer e chama. E vem acompanhado por grandes músicos locais que preenchem os espaços musicais com o poder dos seus talentos individuais, tais com o já citado Cleverson Baía, o Valério de Luca na bateria, Taronga, Alan Gomes e Odair, no contrabaixo (estúdio) e as participações especiais de Jeferson Silva no acordeon, Beto Oscar na viola e Ceará da Cuíca, que deram um “molho” fora do comum na execução das músicas.

Na canção “O Abreu Abriu o Bar”, um belo samba-bossa, Osmar mostra a realidade dos freqüentadores do local, retratando com a maior fidedignidade poética possível o que ali se sucede cotidianamente: os porres, os amores, os amigos, os poetas, a ilusão dos boêmios contumazes, o fiado, os jogos que passam na televisão e o apaixonado grito de gol do time do coração.

Suave, ótimo para ouvir e se deleitar, este CD é mais que um retrato do que se vem produzindo na música pelos nossos compositores e músicos: é, também, um ato de valorização das nossas coisas tradicionais – o próprio bar – já que tantos outros desapareceram e foram transformados sem que ninguém pudesse fazer alguma coisa. O bar Xodó, por exemplo, é apenas uma permanência na nossa memória, algo que fica porque representou um local da boemia macapaense que até hoje centenas de ex-frequentadores continuam festejando em réveillon, desde 1998.

Bom também será olhar o aspecto gráfico do produto. Um painel com caricatura dos proprietários e clientes, desenhado pelo artista plástico Alexandre Torres, procura retratar a o ambiente do bar, onde Osmar aparece em primeiro plano com seu violão.

A música de referência traz ainda uma homenagem póstuma aos poetas Alcy Araújo e Isnard Lima, citados nominalmente na canção, por serem também, como o compositor, insignes clientes do BA.

O CD “Osmar Jr. No Bar do Abreu” amplia o universo criativo do compositor, populariza ainda mais sua obra e representa uma ponte que reduz o fosso entre a música aqui produzida e a nossa vida amapaense.

Artigo publicado no Jornal A Gazeta, de 13/07/2009, disponível em http://www.jornalagazeta-ap.com/opiniao.htm

Fatos Históricos | QueDiaeHoje.NET

Fatos Históricos QueDiaeHoje.NET: Fatos históricos do dia 13 de julho
1939 - O cantor Frank Sinatra gravou seu primeiro disco. Ele era vocalista da orquestra Harry James.
1930 - Treze seleções participaram do primeiro Campeonato Mundial de Futebol, realizado em Montevidéu, no Uruguai.
1960 - O senador John Fitzgerald Kennedy venceu as eleições para a presidência dos Estados Unidos.
1917 - Milhares de pessoas se reuniram em Fátima, Portugal, para esperar a aparição da Virgem Maria, que teria sido vista por três crianças da região.
1992 - Yitzhak Rabin assumiu o cargo de primeiro-ministro de Israel. No ano seguinte ele assinaria um acordo de paz com o líder palestino Yasser Arafat, em Washington.
1989 - Começa em Paris a comemoração do bicentenário da Revolução Francesa. Trezentos chefes de Estado comparecem aos festejos. 2000 - O presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, sanciona a lei de ajuda especial, concedendo 1,3 milhões de dólares ao Plano Colômbia, de luta contra o narcotráfico
1990 - Aniversário do ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente. A Lei nº 8.069, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente, foi promulgada em 13 de Julho de 1990."

DIA MUNDIAL DO ROCK

O Rock no Mundo
O rock foi dos estilos musicais mais controversos já criados na história da música. Surgiu em meados da década de 50, nos Estados Unidos, oriundo, primordialmente, do blues e da country music do sul daquele país. Desde seu nascimento, o rock gerou polêmica, seja por causa da simplicidade de suas estruturas musicais, da atitude transgressiva de seus executores ou da pretensa rebeldia que de seus fãs emana. Os primeiros roqueiros, Bill Haley, Chuck Berry, Little Richard e alguns outros, tornaram-se artistas de espetacular sucesso justamente por causa dessas características, o que os fez amados pelos jovens e odiados pelos pais conservadores.
http://www.geocities.yahoo.com.br/rebelancer3/historia_rock.html




O Rock no Brasil
O primeiro sucesso no cenário do rock brasileiro apareceu na voz de uma cantora. Celly Campello estourou nas rádios com os sucessos Banho de Lua e Estúpido Cupido, no começo da década de 1960. Em meados desta década, surge a Jovem Guarda com cantores como, por exemplo, Roberto Carlos, Erasmo Carlos e Wanderléa. Com letras românticas e ritmo acelerado, começa fazer sucesso entre os jovens.Na década de 1970, surge Raul Seixas e o grupo Secos e Molhados. Na década seguinte, com temas mais urbanos e falando da vida cotidiana, surgem bandas como: Ultraje a Rigor, Legião Urbana, Titãs, Barão Vermelho, Kid Abelha, Engenheiros do Hawaii, Blitz e Os Paralamas do Sucesso.Na década de 1990, fazem sucesso no cenário do rock nacional : Raimundos, Charlie Brown Jr., Jota Quest, Pato Fu, Skank entre outros.

domingo, 12 de julho de 2009

10/7/1931 - Nasceu R. Peixe, Artista Plástico.




R. PEIXE, O MESTRE ESQUECIDO

Raimundo Braga de Almeida, o R. Peixe foi o mais popular e eclético artista plástico do Amapá que se tem notícia. Muitas de suas obras ainda estão dependuradas em importantes repartições públicas do Governo Estadual e da Prefeitura Municipal, além de edifícios federais e nas paredes de casas particulares, cujos donos sabiam da importância de seus trabalhos e os colecionavam. Nas exposições realizadas nas décadas de 60, 70 e 80, sempre com o apoio governamental, seus quadros já saíam praticamente todos vendidos ou reservados, pois nesse período se valorizava muito as paisagens amazônicas, uma temática comum utilizada por ele. R. Peixe também produziu centenas de paisagens urbanas, nas quais os aspectos da fortaleza de São José eram evidenciados, bem como a velha igreja, a doca, a dança do marabaixo e retratos de personalidades locais.

Quem chegava a Macapá por avião logo via um imponente painel no aeroporto internacional retratando a cidade, vista sob o ângulo principal do forte, e o admiravam, como se fosse um convite para conhecer o belo monumento militar construído pelos portugueses no século XVIII. O Palácio do Governo possui um painel semelhante. O Tribunal de Contas do Estado é todo decorado com obras interessantes desse artista. Infelizmente não há como saber a quantidade de obras porque muitas foram roubadas por administradores inescrupulosos. Talvez com a implantação do Museu da Imagem e do Som que o Governo pretende montar em breve seja feito um levantamento das obras artísticas compradas por ele.

Apesar de ter falecido há pouco tempo quase nada se tem ouvido falar desse importante artista. Suas obras abrangem a escultura, a pintura e o desenho, embora tenha iniciado sua vida como fundidor de objetos de alumínio e ferro e depois se especializado em modelagem de gesso. Ao vir para Macapá em 1952, depois de muito lutar conseguiu emprego na antiga Olaria Territorial, onde fazia desenhos marajoaras para mosaicos e artefatos ali produzidos. Vendeu muita paisagem em casco de tartaruga naquela época. Foi goleiro do Trem Desportivo Clube, do São José e do Juventus, tendo encerrado sua carreira em 1959. Foi sambista muito popular, que após revolucionar o carnaval local, inserindo novos instrumentos na bateria de uma escola e extinguido os instrumentos feitos de madeira e couro de cobra. Fundou a Escola de Samba Piratas da Batucada e mais tarde a Cidade de Macapá. Foi considerado o maior dançarino de salão de Macapá e um grande boêmio.

O pintor expôs pela primeira vez em Macapá em 1962 e realizou inúmeras outras em importantes estados brasileiros e na Guiana Francesa. Nasceu em São Caetano de Odivelas, em 10 de julho de 1931 no Pará e em 1990 recebeu com justiça o título de Cidadão Macapaense pela Câmara de Vereadores do Município de Macapá.

O que vejo também como importante na vida de R. Peixe foi a sua contribuição às atuais artes plásticas do Amapá, pois foi o idealizador e fundador da Escola de Arte Cândido Portinari, que hoje revela o talento de jovens artistas de nossa terra.

Antes de seu falecimento em 2004 o artista encaminhou a vários órgãos culturais do Estado uma proposta de edição de livro sobre sua vida e obra, escrito pela sua segunda esposa Elizabete Rolim, quando ainda morava em Natal-RN.

É possível que os familiares de R. Peixe ainda possuam a cópia desse trabalho que merece ser editado pela sua importância histórica e artística. O Mestre, não pode ser esquecido.
Tela de R. Peixe que representa a frente antiga da Cidade de Macapá, Amapá, produzida em 2002
(Acervo de Fernando Canto)

sábado, 11 de julho de 2009

PRECE PELAS MÃOS


Senhor,
Quando a indolência frear minhas mãos
Para protelar o trabalho iniciado
Dai-me a força do vento

Quando a pressa remetê-las à imperfeição
Dai-me do mesmo modo a calmaria
Para refletir sobre o motivo da partida
E a certeza do ponto de chegada

Da perfeição da natureza
Dai-me o milionésimo da sua semelhança
Encontrada na sabedoria das estações
Que amarelecem e regeneram as folhas
Nos mais recônditos lugares
No propósito da renovação constante

Se minhas mãos não obedecerem à ordem do trabalho
Empresta-me, Senhor, o movimento bruto
Das ondas dos teus rios
Para que emirja em mim o esforço e a perícia
De conduzir o barco ao seu destino

Senhor,
Que o alimento em minha boca seja limpo
Desde o gesto do plantio até a colheita
E que nuas, minhas mãos que o semearam
Te louvem, te agradeçam e não esmoreçam
Quando precisarem ajudar meu semelhante.

JOSÉ SEBASTIÃO DE MONT'ALVERNE

Meu amigo Zeca Mont'Alverne, grande violonista, encontra-se em São Paulo em tratamento de saúde. Que volte, restabelecido, para o nosso convívio e continue a nos encantar com seus acordes geniais. É o que pedimos a Deus.
Esta imagem foi capturada em dezembro de 2008, em apresentação realizada na Universidade Federal do Amapá - UNIFAP.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Momentos Leonardo

Com papai e mamãe no rio Pedreira


No Marcozerinho do Aeroporto de Macapá

Na Entorno da Fertaleza de São José


Passeio no Rio Pedreira com Vô Fernando e Tio Juvenal Canto


Observando pombos no entorno da Fortaleza São José de Macapá


Com papai Lênio Mont'Alverne






ANIVERSÁRIO DE LEONARDO - 5 anos

Leonardo Mont'Alverne, nascido 10/07/04
Netos,Avós e Parentesco
Por Fernando Canto

Imagine aquela pessoa chegar, adentrar o seu quarto e começar a mexer em tudo, a apertar botões, tirar as coisas do lugar, jogá-las no chão, e você fica ali. Parado. Sem dizer nada. Esperando o desfecho das coisas com passividade e calma. Não. Não é um assalto, não há nenhum bandido lhe ameaçando.


É seu neto de dois anos que chegou para mais uma visita ansiosamente esperada. Mais bobo ainda, você o convence a bagunçar mais, a fazer festa com controles remotos, com o ar condicionado, o rádio, e qualquer outro objeto que estiver no local. E ainda participa de coisas que até então não admitiria que seu filho fizesse. Jamais deixaria que as pessoas vissem o seu garoto como um mal-educado, sem formação familiar, alguém descontrolado, sob pena dos olhares de censura. Mas não é o seu filho. É o seu neto de dois anos que está ali. Desfrutando, talvez uma liberdade imensurável que a liberalidade dos avós permite em nome de um sentimento que só se conhece quando se é o pai do pai, mesmo torto, o padrasto do enteado, mas referência inelutável de parentesco.


O mito de que uma criança criada pela avó pode ter desvio de caráter no futuro não passa de um preconceito arraigado. É possível que a ausência dos pais, nesse caso, leve ao excesso de mimos e de satisfações de vontades. Há quem diga que a relação avós/netos é a oportunidade que os primeiros têm de consertar os erros que cometeram com os filhos, dando aos segundos o que não puderam dar a estes.


Aliás, voltando à questão do parentesco, sabe-se que é um termo pouco preciso para denominar relações entre pessoas, baseadas em certas formas de afinidade comum, real ou suposta. Para a sociologia é preciso reconhecer a distinção entre parentesco meramente biológico e parentesco socialmente reconhecido. Supõe-se que pode haver ligações consangüíneas às quais falta o reconhecimento social, aonde a consangüinidade não conduz a nenhuma forma de relação social. Já o parentesco socialmente reconhecido nem sempre repousa sobre uma base realmente consangüínea. Portanto, hoje o parentesco é de uma classificação mais complexa, mormente se se levar em conta os divórcios e os casamentos que separam e unem ex-famílias nucleares para a formação de outras. E isso é muito característico das sociedades ocidentais, que também são consideradas num sistema de parentesco como bilaterais, pois os parentes são pessoas do lado dos dois pais. A confusão se forma quando não há consangüinidade, apesar dos filhos dos dois pais diferentes e unidos pelo casamento sejam agora “irmãos”.


Não é bem isso que eu queria dizer quando falo do meu neto torto. (– Torto é o avô, diriam). Porém as condições de amar revelam que a consangüinidade não é tudo. Um carinho é um caminho bastante usual para a conquista, mas a atenção excessiva que permite o neto ser o rei e reinar, ser o centro das atenções e saber disso, levam à satisfação de que independentemente de parentesco temos que dar às crianças o máximo possível de amor. Pois o amor, seja ele qual for, é o “produto” garantidor da nossa existência na memória delas.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

REENCONTRO

Óbidos - Pará

A serra da Escama parecia um altar aos meus olhos viajantes. A coloração azul ao longe refletia no céu como um lago de espelho invertido. E eu ali, numa expectativa sem precedentes roía-me de ansiedade.


Entre células que se degeneravam e gotas cadentes quase contidas, eu me preparava para o encontro com a minha memória, com as pessoas e com a minha cidade, após 34 anos de ausência.


A lancha que viajamos vindos de Santarém enfrentava a corrente do Amazonas a vinte milhas náuticas, o equivalente a 32 quilômetros por hora, traduziu-me o primo Alacid. Era um contínuo e injusto embate entre natureza e invento humano. Na aproximação a câmera capturou a paisagem construída e os arredores imersos nas águas da maior enchente de todos os tempos. Dava a impressão de uma catástrofe, pois o sol das doze horas duplicava a luz ao incidir nas águas da frente da velha cidade. Fomos deixados por sobre um cais improvisado que se estendia por uma passarela de três tábuas até a parte mais seca da rua, pois ora a cheia já começava o seu vazamento.


A cidade nos esperava no alto, mas o cheiro de um churrasquinho vendido no pé da ladeira despertou a fome e inevitável foi consumi-lo. Depois subimos a rua das mangueiras. De passo em passo eu me voltava para trás para olhar aquele cenário: era um céu o manto do rio lá embaixo. Embarcações passavam como répteis sobre aquela forma líquida, descendo. Descendo não, correndo, enquanto as outras, menores, se esgueiravam em sua margem no sentido oposto.


Após breve descanso fomos ao centro histórico: então um turbilhão de lembranças aflorou em mim como se eu houvesse participado da construção daquela longínqua vila que se instaurou no solo amazônico. Naqueles outros "dias recurvos", diria o grande romancista obidense Ildefonso Guimarães, creio que construí fortalezas com lágrimas de dor, mas a ferro e fogo rompi a floresta e soterrei os inimigos com a abundante tabatinga do lugar.


Uma volta ao pôr do sol na roda-gigante do parquinho me deu as dimensões da história e das permanências do lugar. A luz sobre cidade direcionava os quadrantes de sua geografia. Perto dali a presença dominadora da Igreja abraçava-me ao vento enquanto o antigo quartel do Exército, com seus minaretes e torreões, quase vermelho ao poente, mostrava toda a sua imponência. O branco cemitério, adiante, se rutilava em prantos dos apelos dos heróis redivivos. Então, aos poucos a cidade foi esmaecendo e sua bela arquitetura colonial tornou-se apenas pingos de um tecido brilhoso de luz artificial.


Confesso que esse encontro fez meu coração bater bem mais acelerado. Aliás, a ânsia fora provocada há tempos, quando o Alacid me convidou pela enésima vez para fazer esta viagem, e eu, enfim, resolvi encará-la. Obidense, o arquiteto e empresário Alacid Canto, como todos os membros da sua família (incluindo, é claro, seu irmão João, que alimenta o site "Chupa Osso"), é um radical propagandista de seu amor por este importante município do Pará, no médio Amazonas, que tem como atração a sua própria história, a arquitetura e uma insólita estrutura cênica natural, na realidade um convite dos deuses para a poesia. E para a música.


Dizem que a memória é aquilo que somos á luz do que não somos mais. Por isso, talvez, este reencontro me sirva para consertar o que não quebrei, mas que a vida fez colidir com os muros que não ergui; que sirva para trazer à tona a amizade que me foi privada pela brusca partida - aquela que deixa quebrantos enrolados nas brumas da serra – porém, que num dia qualquer de sol com chuva volte entre as nuvens. Ou, quem sabe, como um fogo-fátuo, efêmero, mas brilhante.


Ainda estou aqui, velho coração, observando o cimento sobre os paralelepípedos da minha infância. Desacelerando ladeira acima.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

INSELBERGUE


Disponível em http://picasaweb.google.com

Eis que surge assim na paisagem, saliente como um bem-te-vi, uma pedra calva, um monte-ilha protegido pelas armas dos seus querubins.
Quanta variação de formas raras, céu de fogo ardente à espera para conhecer as tuas entranhas, casas de ciladas dendrobatas, nicho de veneno antes da cura de homens que fizeram suas façanhas.
Véus de nuvens cortinam cerrações nas manhãs de pássaros cantores, tal como arrancassem corações de quem guarda segredos furta-cores.
Serras, rios, montanhas, cordilheiras. Tempo em espiral, hora de ataque às deusas que dormitam no horizonte. Entes que já são tumucumaques.
Lá longe na guiana, Mitaraka, o monte, se levanta gritando em desespero com sotaque.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

FUndofuNDO

Meu destino é naufragar nas tuas águas de marés itinerantes como eu

Quero mesmo aguar-me em ti como um peixe morto de velhice ou devorado por cardumes nascituros preso ao último instante às armadilhas das cadeias ecofundas

E perecerei meio sem alma fundido em ferroespírito para me tornar parte de ti matéria transparente âmbar líquido na escuridão do fundo não na mera margem que comprime tua passagem ao mar

Publicado no livro Equinocio – Textuário do Meio do Mundo – Editora Paka-Tatu – Belém, 2004

domingo, 5 de julho de 2009

SÃO JOÃO E OS COSTUMES EM MUDANÇA

Festa Junina em Campina Grande-PB - Imagem disponível em <http://bacurau.com.br/wp-content/uploads/campina.jpg>.

Quando chega a época de São João vejo muita alegria nos olhos das pessoas. É um tempo saudável de festas, inesquecível na vida de quem um dia se arriscou a dançar ou a participar de alguma forma dos seus rituais. Rituais estes que se modificam no decorrer dos anos, quando se abandonam práticas que se tornam obsoletas e que não condizem mais com a modernidade instaurada violentamente pela mídia ou pelos costumes.
Um dia desses um amigo me confidenciou que não gosta mais de assistir “essas quadrilhas todas doidas, cheias de remendos e recortes musicais que mais parecem um arremedo de bailado antigo”. Disse que se trata de uma caricatura das quadrilhas do passado, que devido às competições se tornaram visivelmente cultura de massa, feitas para um público ávido de olhar mais a sensualidade das meninas quase nuas do que os passos seguros e graciosos da dança de salão mais popular do Brasil, nessa época. Disse-me ainda, com um ar de tristeza, que o São João está carnavalizado e que só falta colocarem abadas nos participantes para desfilarem na Beira Rio.
Certamente esse é um ponto de vista interessante, e um tanto exagerado, tendo em vista que os costumes e as tradições se modificam com o tempo, e que agregam valores quando necessitam e desprendem outros quando não mais precisam. Daí a palavra tradição significar “transmitir”. E transmitir de uma geração para outra, absorvendo tecnologias novas e inúmeras outras formas de expressão, linguagem, comunicação e de desempenho. Os tempos atuais exigem essas mudanças na essência de qualquer manifestação popular, para que elas não se agonizem, para que não morram. Não podia ser muito diferente com as práticas populares das festas juninas.
Hoje, com a evidência dos valores ambientais, com a condução da tradição das festas juninas nas escolas e outras instituições, poucos se arriscam, por exemplo, a acender uma grande fogueira na rua, conscientes que estão do incômodo que poderão causar à vizinhança e, sobretudo, dês estarem sujeitos a responder a algum processo por crime ao meio ambiente, se acaso os setores repressivos da área forem chamados para intervir.. Há um constante cuidado de se fazer tudo “politicamente correto”. O São João das fogueiras, dos compadres e comadres que “passavam fogueira” se acabou e hoje ocorre mais nas quadras das escolas e salões de clubes, com os compressores de ar movimentando as pseudo-chamas sobre um amontoado de isopores que imitam a fogueira. As músicas envolventes dos ritmos nordestinos não foram substituídas totalmente, mas há uma forte tendência a ter os modismos musicais incorporados, dependendo do descuido do promotor da festa e do enxerimento do tal didhei (DJ), que controla a aparelhagem de som.
Ainda bem que em Macapá não temos a tradição de soltar balões. Seria o caos ambiental. Entretanto, se alguém passar em frente a uma sede onde se realizou uma dessas festas vai constatar que o cuidado com o meio ambiente está mais para discurso do que para a prática: palmeiras cotadas na véspera ficam fincadas por dias no local e o lixo se espalha ao sabor da chuva e do vento sem ninguém se tocar.
Para mim o tempo de São João é um tempo meio adolescente, um tempo de lembranças e de amores infantis que se perderam no espocar dos foguetinhos. O São João é um tempo em que os sonhos se confundiam com o colorido das bandeiras. Um tempo em as brincadeiras da época agora parecem contracenar com a gente, neste cenário onde o fogo das fogueiras é uma ilusão que se apaga paulatinamente em nossas vidas.

Por Fernando Canto (Publicado no jornal “A Gazeta” de 5 e 6/07/2009)

sábado, 4 de julho de 2009

Monteiro Lobato era um homem movido a paixões




Paixão pelas crianças,
Paixão pelo Brasil,
Paixão pela comunicação.

Mais da metade de seus livros Monteiro Lobato escreveu para o
público infanto juvenil, com a intenção de ajudar na formação intelectual e
moral da nossa juventude. Há pelo menos três gerações de brasileiros que se desenvolveram sob a influência de suas obras e de seu pensamento.
A outra parte de sua obra é basicamente política, como política era também sua militância intensa como jornalista e editor. Era política porque mostrava sua grande preocupação com a situação de nosso povo e seu engajamento nas lutas por mudanças na sociedade brasileira. Consequência dessa luta sofreu as agruras das prisões e da perseguição.
Toda sua vida e seu trabalho estiveram dedicados à luta pela preservação dos valores culturais e das riquezas naturais da Nação.
Foi pioneiro na luta pela preservação de nossas florestas, de nossos índios e de nossos bichos.
Monteiro Lobato não podia viver sem estar se comunicando com as pessoas, principalmente com as crianças. Sua obras incitam ao diálogo e à busca de parceiros para as brincadeiras. Quando escrevia em jornais, fazia questionários e pedia a opinião de seus leitores. Se Lobato estivesse vivo seria um grande interneteiro. Estaria aproveitando ao máximo a interatividade, a possibilidade de diálogo, a capacidade de reunir gente oferecida pela rede mundial. (Disponível em http://www.projetomemoria.art.br/MonteiroLobato/monteirolobato/index.html)

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Fatos Históricos QueDiaeHoje.NET: Fatos históricos do dia 4 de julho
1997 - A sonda espacial norte-americana Mars Pathfinder chega ao planeta Marte. A missão comandada pela Nasa (agência espacial norte-americana) tem o objetivo de estudar o planeta vermelho e procurar sinais de formas de vida, como um primeiro passo para uma viajem tripulada a Marte.
1904 - O canal do Panamá começou a ser construído com o objetivo de ligar os Oceanos Atlântico e Pacífico na América Central.
1980 O presidente João Figueiredo desapropriou uma área entre Iguape e Peruíbe, em São Paulo, para a instalação de duas usinas nucleares.
1776 - Os Estados Unidos conquistaram sua independência.
1959 - A tenista brasileira Maria Esther Bueno venceu o torneio de Wimbledon, aos 19 anos.
1948 - Morre o escritor paulista Monteiro Lobato. Maior nome da literatura infantil brasileira, Lobato escreveu os livros 'As Reinações de Narizinho' e 'O Sítio do Picapau Amarelo'.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Dança da criação

Foto de Fernando Canto: Tarde na Praia de Fazendinha
Um canto de amor à cidade,
a bem dizer, este poema.
Uma necessidade vital, um amor
sem preconceitos,
puro e apaixonado.
Macapá de ontem e de hoje,
Histórica e sem farsas.
Telurismo versus pés descalços,
um banho de água doce
neste mar que encanta e
faz permanecer um universo.
Sensação de trabalho iniciado
pela perspectiva de inúmeras rotações.
Nós que guarnecidos em fortalezas
e tocados pela linha imaginária
do equador, somos forçados a cantar
acompanhados por um vento ameno
e pela voz que a paisagem, a gente
e a História fotografam em nossa mente.
A terra, o rio, a chuva e o sol do equador
encerram em si um micro-mundo,
autêntico, que provoca
a dança da criação
num ritmo de tatos vivenciados e amados
durante todo um tempo
em que enraizamos
e nele formamos nossa cultura.
Este pequeno roteiro, aliás,
uma viagem iniciada há anos,
é traçada única e exclusivamente
pelo amor.
Um amor à terra
e ao que nela existe
um amor sincero e perene
para que a existência se torne mais significante.
É uma homenagem
em forma de cantiga,
uma poesia larga e bela,
onde, sobretudo, está patente
uma declaração de amor.

Santo do Dia


Santo do Dia: 3/Julho
São Tomé, Apóstolo e Mártir
De acordo com a tradição, São Tomé pregou a Boa Nova do Evangelho em várias partes do Oriente, e foi receber na Índia a graça do martírio. Teria também estado no Brasil. Narram as Escrituras que duvidou da Ressurreição de Nosso Senhor e por isso teve o misericordioso privilégio de tocar com seu dedo as chagas do Corpo glorioso de Jesus Cristo.

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Fatos Históricos QueDiaeHoje.NET: Fatos históricos do dia 3 de julho
1928 - A primeira transmissão mundial de uma televisão em cores foi feita em Londres, na Inglaterra
1928 - A primeira transmissão mundial de uma televisão em cores foi feita em Londres, na Inglaterra 1962 Charles de Gaulle, presidente da França, anunciou a independência da Argélia
1987 - O nazista Klaus Barbie, conhecido como o 'açougueiro de Lyon', foi condenado a prisão perpétua por crimes contra a humanidade.
1996 - Boris Yeltsin foi reeleito presidente da Rússia. Ele foi o primeiro governante eleito depois da dissolução da União Soviética
1971 - Jim Morrison, líder da banda The Doors, foi encontrado morto na banheira de um apartamento alugado em Paris.