Poema de Luiz Jorge Ferreira, do livro “O Avesso do Espantalho”, Scortecci, São Paulo, 2010
Olho para trás para tentar me ver;
E me vejo, no último Maio.
Pintando em Degradê no fundo do prato de parede.
Com a invasão das formigas de asas
Perdi as digitais, enterrei a voz e engordei.
Eu sempre olho para trás.
Da estante, uns discos, uns livros, um sulco, um silvo, um uivo.
Acenam sutis.
As camélias estão na parte posterior dos ângulos.
Engulo Bons Dias e Boas Vindas. Em silêncio.
Não tenho hábitos.
- Eu gosto do mar sem sal, só a espuma no copo.
Um dia recordarei os pássaros, voando no bordado da cortina.
De noite os passos, as Bem Aventuranças,
E o Batuque do Marabaixo.
Moribundo ao lado dos grandes troncos que flutuam sem
Destino, na Baia de Macapá.
Olharei por cima de inúmeros Outonos.
E por fim, eu, construído de folhas, fotos e diagramas,
Terminarei próximo de mim.
Para a felicidade das formigas de asas.
Elas não precisam esperar o término da quinta página.
Para beber da chuva que ensopa minha pele.
Elas continuarão a invadir a tarde carregando asas sujas de nada.
São soberbas!
Como eu, voam como se transportassem vidas.
Como eu, vivem como se arrastassem voos.
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