domingo, 11 de julho de 2010

DESPOJOS DA COPA

Publicado no jornal “A Gazeta” de domingo, 11/07/10

perpetuo socorro5_copa_thumb[2] E agora, depois que o Brasil perdeu a Copa? Quem vai limpar as ruas enfeitadas de bandeirinhas, fios e sujeiras pintadas de qualquer jeito nas ruas, durante a euforia de duas vitórias e um empate? Certamente não são os atletas do Dunga, os eletricitários da CEA, nem os garis da Prefeitura. Mas a marca do acontecimento está lá e, mesmo quem promoveu a decoração não está nem aí para a pós-produção. Até hoje se podem ver desenhos e caricaturas da Copa passada espalhados por muros e recantos da cidade. E ninguém limpou, é obvio. E já se foram quatro anos.

Sempre que isso acontece, aliás, sempre que acontece um evento de rua nenhum morador da área interditada pela PMM vai ter que se preocupar com a limpeza. Todos alegam que pagaram impostos e taxas e por isso quem tem que fazer o serviço sujo é quem recebeu o pagamento.

Enquanto isso a sujeira vai se acumulando e enfeando certas áreas da cidade sem que ninguém, ninguém mesmo ligue.

Por inúmeras vezes a imprensa vem alertando para esse tipo de coisa, mas elas chegam a ocorrer ao contrário. Um órgão oficial da cidade chegou a promover concurso para premiar a melhor rua enfeitada para a Copa do Mundo: dezenas participaram buscando o prêmio que daria para promover várias festas de comemoração. E o ato oportunista foi amplamente divulgado, afinal estamos em campanha política e tudo o que for investido pode dar voto.

A esse pensamento populista não pode estar vinculado uma cidade forte. Uma cidade forte tem que ter músculos e neurônios sadios, gente que pense a substância do ato político como proposta para melhorar a vida dos cidadãos, educá-los por meio de campanhas educativas e culturais permanentes, para que sintam orgulho da cidade em que moram.

Até hoje os setores públicos não conseguiram aplicar a Lei Orgânica ou as posturas municipais para punir elementos que teimam em poluir e prejudicar a cidade em vários dos seus pontos, comprometendo a saúde da população. Sinto-me indignado quando passo atrás do estádio Milton Corrêa e vejo dezenas de urubus e cães sem dono roendo osso e comendo carcaças ali deixadas por anos a fio por possíveis açougueiros. Alguém tem que multar esses indivíduos que não gostam de Macapá.

Naturalmente que não são somente esses os poluidores, os que se livram do lixo do seu quintal e querem que a prefeitura assuma o resto. A PMM tem sim, que devolver o lixo para esses espertinhos. Tem que ir mais longe, inclusive com aqueles que teimam em estender suas garagens para a calçada dos pedestres; que tapam o passeio público com suas placas comerciais; que fazem barreiras intransponíveis em forma de degraus e vasos de plantas; que jogam água servida e de suas piscinas no meio fio e, pior, constroem fossas sob as calçadas. Tudo isso obriga o cidadão a andar na rua, o que se constitui uma das maiores causas de atropelamento e morte no trânsito, todos sabem.

Não existe cidadania sem acessibilidade e sem a lógica do direito de ir e vir. Por isso mesmo algo tem que ser feito além do plano de mobilidade espacial. Um plano mais humano, com a severa aplicação da lei é que deve ser posto em operação, e com interatividade social, pois a resposta da sociedade é a mais evidente forma de saber como planejar e executar projetos urbanos.

Quanto à “patriotada” dos enfeites de rua, deveria ser feito como determina a lei eleitoral: o candidato é o responsável pela remoção da sua propaganda eleitoral três meses depois da eleição. Isso facilita a despoluição visual da cidade e a leitura inconsciente de propaganda de políticos sem bons propósitos.

Enquanto isso já se pode pensar em como enfeitar (e desenfeitar) nossas ruas em 2014. Antes, porém, é preciso que todos aprendam e apliquem um pouco mais de urbanidade e cidadania, inclusive os setores públicos.

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