Publicado no Jornal do Dia, em março de 2006
Quanto mais vezes o território da segregação, a violência, a deficiência dos serviços públicos de transportes e a degradação ambiental, entre outros pontos significativos, são observados, os setores responsáveis pela cultura pouco ou nada incorporam da visão de guetos que surgem na periferia. Apesar de esforços de poucos, a democratização dos acessos aos bens culturais e a valorização da diversidade étnica regional é uma mentira que nem ao menos tem pernas curtas.
A cidade é o espelho da estrutura sócio-econômica do país e sua forma reflete as desigualdades causadas pelo desemprego, pela má distribuição de renda e pelos grandes paradoxos sociais e culturais que existem e que carecem de intervenções eficazes e mais abrangentes. A juventude sem escola, sem transporte ou emprego é conduzida à não-cidadania, e à invisibilidade social, cuja saída para a sobrevivência está na criminalidade, infelizmente uma lógica perversa que não pode ser desmontada sem uma utopia e o esforço solidário dos governos e da população.
O Ministro Gilberto Gil disse que “as cidades são esfinges que devoram antes e perguntam depois” ao referir-se à omissão do setor público, que promove o surgimento de um território informal onde o foco da violência se propaga rapidamente dos guetos e favelas para as grandes cidades e contamina o resto do país. No bojo desta questão Macapá não foge á regra. Mesmo levando em conta as dimensões da violência, sua proporcionalidade e freqüência criminal, ainda se pode oferecer à juventude serviços educacionais públicos de certa qualidade. Pode-se, sim, superar a exclusão através de projetos e medidas transformadoras em nível cultural que confere à criatividade dessa juventude valores potencializados. Acreditar nela é acreditar que tudo de ruim tem saída e que se pode produzir e dar dimensão econômica à cultura, sem o paternalismo exacerbado que sempre fez o favor de não construir nem estimular a contento a nossa produção. Aí então surge entre tantas outras atividades e projetos em todo o Brasil, a experiência bem sucedida dos movimentos afrorregae, timbalada e hip-hop, que Gil considera “expressões transdisciplinares, fruto da contaminação urbana”. O hip-hop é para o Ministro, “discurso, dança, poesia, música, design, moda e símbolo da cultura contemporânea em sua máxima potência”.
O movimento hip-hop (que quer dizer “mexer os quadris”) surgiu nos EUA na década de 70. Reunia negros e latinos e quatro ingredientes: um DJ que tocava bases ritmadas; um MC (Mestre de Cerimônias) cantando letras improvisadas; os breakdancings (dançarinos) e o grafite (pintura com spray). O rap, que os MCs cantam significa rhythm and poetry (ritmo e poesia). Surgiu dentro da cultura do hip-hop, mas hoje são quase sinônimos. Existem inúmeros nomes, gêneros e estilos (Fonte: Revista Estação Juventude, nº 2/2006)
Em Macapá, um dos líderes do movimento é o dublê de jornalista e MC Poca que há alguns anos vem trabalhando com jovens em situação de vulnerabilidade social, juntamente com o MC Spike, que coordena 65 jovens no bairro Marabaixo III. Nos finais de semana ministram cursos de dança, grafite e palestras nas escolas sobre a questão racial e outros temas. Poca diz que o hip-hop significa um instrumento de transformação da juventude. Até mulheres fazem parte, como o grupo DRF (Dança de Rua Feminista), com cinco integrantes. Há programas de rádio específicos do movimento: o “Hip-hop na Veia”, aos sábados na Difusora e o “Quilombos e Periferias”, também aos sábados ao meio-dia na rádio Novo Tempo, 105,9 FM. O movimento promove eventos como o “Batalha Amapá”, um campeonato internacional de dança de rua muito conceituado e disputado por grupos dos países fronteiriços e de quase todo o Brasil. Na finalização do “Batalha Amapá” de abril/2006 está sendo esperado o GOG, de Brasília, considerado um dos melhores poetas do rap nacional. Há muitos grupos em Macapá que utilizam o folclore e transformam músicas locais em rap.
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