sábado, 21 de novembro de 2009

A FILA

Publicado no Jornal do Dia em agosto de 2007

fila (1) Uma fileira de pessoas que chegam e se põem umas atrás das outras por ordem cronológica em algum lugar em que querem obter algum serviço ou coisa semelhante é uma fila. Seria, pelo seu valor consuetudinário, a coisa mais simples e democrática deste mundo. Cada qual no seu direito de ser atendido conforme a sua vez de chegada.

Mas no Brasil a fila nem sempre é uma coisa simples. É sempre objeto de leis organizativas em centenas de municípios. São famosas as filas inquietantes e desumanas, onde até já morreu gente como em hospitais, bancos, transportes, serviços de pagamentos de água e luz, e até nas infindáveis “filas do INSS”. Muitos problemas de tempo já foram solucionados por meio desses expedientes obrigatórios ou mesmo desburocratizantes que as próprias instituições que a utilizam no dia-a-dia o fazem para diminuir custos. Não pensem que é para ajudar os pobrezinhos dos clientes: grávidas, idosos, mulheres com crianças de colo e pessoas deficientes são beneficiadas mais por causa das leis humanizantes do que pela condescendência dos banqueiros, de seus afins e concessionários de serviços públicos.

Estar em uma fila é uma situação muitas vezes chata por causa da espera obrigatória. A pressa, o tempo que o trabalho impõe para um horário corrido e apertado condiciona a todos. Por isso muitas vezes se criam categorias especiais para atendimento, como o cliente especial dos bancos, que por ter mais dinheiro que os clientes normais, é atendido com presteza, rápido, e com um grande sorriso de satisfação. Enquanto os enfileirados suam, o “especial” se desvencilha do compromisso para ir em busca de mais ganhos, afinal o tempo é dinheiro.

E é nesse contexto que a gente mais observa as características dos que passam longo tempo em filas. A figura do cara-de-pau, por exemplo, aquele ser dissimulado que quer ter vantagem em tudo, é o conhecido “furão”, um peculiar malandro brasileiro. Ele chega e começa a conversar com um suposto amigo que lhe reservou lugar e fica lá até ser atendido. Ninguém fala nada, mas você fica indignado e pensa: – Deixa essa p. pra lá! É comum quando você já está perto de chegar ao guichê aparecer uns cinco ou seis dizendo que já estavam na fila, que marcaram o lugar. Você se assusta, mas não tem jeito. Brigar pra quê? Há aqueles que ao saberem que vão demorar começam a puxar papo e daqui a pouco se tornam íntimos nas suas conversas, mesmo sabendo que dificilmente tornarão a se encontrar. Existe a figura do organizador de fila, principalmente nas casas lotéricas, quando tem muita gente e chove, ou o sol da tarde bate forte. Há os reclamantes, que dizem que a fila não anda ou que alguém está fazendo apostas pelos outros e que vai, portanto, demorar mais. Não é difícil encontrar nos caixas eletrônicos aquela figura que deixou para fazer todos seus pagamentos naquele dia, justo na sua frente, quando você precisa urgentemente retirar dinheiro para pagar o táxi ou o gás que acabou pertinho do almoço. E os cambistas nas filas dos estádios e dos shows de artistas famosos? Esses, com o perdão do trocadilho, são impagáveis. Porém, pior mesmo são aqueles filistas. Filistas? Se a palavra não existe, passa agora a existir para nomear os portadores de celulares que ficam atrás da gente falando alto e fazendo da fila um escritório. Estes não alugam, eles filam (pedem) nossos ouvidos. Para finalizar lembro daquele que chega todo sorridente atrás da gente e faz a pergunta imbecil: - O senhor é o último?

Os portugueses chamam bicha para fila. E certa vez um amapaense foi a Portugal e, meio malandro, tentou furar a fila no supermercado, pois estava com pressa. Os portugueses se indignaram e gritaram em uníssono: - Olha a bicha, olha a bicha! E ele, assustado, perguntou: - Como é que vocês me descobriram aqui em Portugal, geeen-te do céu?

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