quarta-feira, 16 de maio de 2012

ISNARD LIMA MORREU! (*)


Alcy Araújo
            Segunda-feira, oito horas da madrugada. Este cronista estava na maior fossa. Havia chorado. É que as filhas – Astrid e Aline – haviam acabado de voar com destino a Belém, da Província do Grão Pará. Terminada as férias de verão, depois de festinhas, pele dourada pelo sol da fazendinha, elas retornavam ao seu cotidiano estudantil, em busca de um título universitário, deixando uma tremenda saudade. A mãe com lágrimas prontas a escorrer pela face, as irmãs entristecidas, com a caçula choramingando a ausência das mais velhas.
            O cronista com uma dor no peito, uma saudade apertando a alma e o coração e o coração. Então adentra o nosso “studio” o poeta Obdias Araújo, “avec” a namorada atual. Segunda-feira, oito horas da madrugada, era alguma coisa de inusitado. E informa, sem mais aquela: o Isnard Lima morreu e seu corpo está sendo velado na Escola de Música “Walquíria Lima”.
            Esclareceu que a informação havia partido do Jansen, amigo e patrão do poeta de “Malabar Azul”. Isnard levara a mão ao peito, dera um berro angustiado e sua alma escapara pela boca. Havia desencarnado, com sua alma voando para as estrelas, com asas de cristal.
          Então o Obdias, portador de notícia tão triste, deixou o “studio” e partiu para o velório, com a promessa de telefonar dizendo a hora do enterro e os motivos do repentino óbito.
            Algum tempo depois tilinta o telefone. Aquela voz do além está do outro do fio. A voz pergunta se está tudo bem. Reconheço o Isnard, falando. O Isnard é capaz de tudo, até de telefonar do orelhão de São Pedro. Acostumado a conversar com almas penadas, espíritos de luz, anjos, caboclos e pretos velhos, perguntei como ele estava sendo tratado ao lado de Vinícius, Cartola, Bilac, Guimarães Rosa, Noel e Mário Faustino. Perguntei se podia falar com o Georgenor Franco.
          Então o Isnard falou que não tinha subido. Estava telefonando do “Walquíria Lima” ou do Bar do Abreu, sei lá. Estava vivinho da silva.
            E eu que já estava pensando em escrever alguma coisa que servisse como epitáfio para o poeta dos postes da Rua Leopoldo Machado, fiquei até certo ponto frustrado. Uma frustração, misto de alegria, na fossa da segunda-feira.
            Isto posto, acendo um cigarro. Espremo uma laranja até o bagaço. Coloco o suco num copo alto, dois cubo de gelo e uma generosa dose de Vodka.
           Penso em Nonato Leal, sem qualquer razão aparente. Sento na “Remington 33” e escrevo esta crônica. E a paz volta a reinar no mundo conturbado, com o sol entrando pela janela, espantando a noite que há de vir.

(*) Publicado no jornal Amapá Estado, edição de 08 de agosto de 1987

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