Publicado no jornal “A Gazeta” de domingo, 29/08/10
O reparo de um erro anunciado na coluna do jornalista Paulo Silva, feito por ele mesmo no dia 05 de agosto de 2008, só fez merecer cada vez mais a minha admiração por este profissional da imprensa diária, sempre preocupado em levar a notícia correta ao leitor. Paulo admitiu que queria dizer “cesta” básica e traçou “sexta” básica, dando uma tropeçada na língua portuguesa. Tratava-se de um erro gramatical comum, um homófono, vocábulo que tem o mesmo som de outro com sentido e grafia diferente.
Hoje raramente um profissional admite seu erro e o publica. É mais fácil botar a culpa na revisão, e esta confia que o jornalista faça esse trabalho, afinal os computadores têm seus programas próprios que permitem extirpar os erros mais elementares. Mesmo assim é preciso estar atento para as correções computacionais, pois a língua muda e sempre aparecem formas não previstas de escrever e de se comunicar.
O que antes consideravam erro de imprensa ou erro tipográfico, quando o tipógrafo ou o linotipista se enganavam na composição dos textos originais (no tempo do jornalismo artesanal), praticamente não existe mais, pois quase todos os jornais são formatados e compostos de forma digital. Mesmo assim os erros aparecem até nos títulos de matérias, embora o leitor arguto possa perceber que não foi intencional. Tal afirmação pode até ser uma falácia, uma meia-verdade como queiram, todavia acredito que nenhum jornal sério tem a intenção de errar. E ainda vejo que a atitude do Paulo Silva pode dar panos pras mangas ao relevar não o erro, mas um possível romantismo oculto na sua forma e técnica de escrever.
Paulo Silva é daqueles jornalistas que não precisam pôr o texto “mastigado” na cabeça do leitor. Quem escreve precisa do leitor e deve considerá-lo capaz de entendê-lo no que diz. Por essa relação pode-se partir do pressuposto que o texto é o produto da interação dialógica entre quem escreve e quem lê. É um lugar de interação entre sujeitos sociais, algo aparentemente simples, mas que carrega consigo uma gama de ações lingüísticas e sociocognitivas mais complexas. Teóricos como Koch acham que a leitura de um texto exige mais que o simples conhecimento lingüístico compartilhado pelos interlocutores. Ele diz que “a leitura é uma atividade que solicita intensa participação do leitor, pois, se o autor apresenta um texto lacunoso ou incompleto, por pressupor a inserção do que foi dito em esquemas cognitivos compartilhados, é preciso que o leitor o complete, produzindo uma série de inferências”. Diz, também, que “depois de escrito, todo texto ganha uma existência independente de seu autor”, pois entre a produção de um texto e a sua leitura, pode-se passar muito tempo, ou quando vem a ser lido em lugar muito distante do que foi escrito.
O gesto do Paulo Silva certamente não foi o de dar satisfação aos patrulheiros gramaticais que abundam no setor jornalístico, mas um ato de grandeza de um jornalista que concebe o jornal como um produto dotado de valor simbólico, transformador da sociedade, formado por homens e mulheres, não por máquinas que produzem assuntos e textos devidamente programados. Se a relação das pessoas com o mundo se dá pelas versões dadas pela linguagem, o gesto do Paulo Silva revela que ao comunicar seu erro a seus leitores, emitiu não apenas um conteúdo formal, mas o que ele decididamente o é com seu caráter, e como encara as pessoas a quem fala.
Que essa conduta sirva de exemplo aos que se consideram “formadores de opinião” e políticos, para que cada sexta (feira) seja o último dia útil da semana e não uma cesta que serve de objeto de troca nas eleições que se aproximam, basicamente entre os que vendem e os que compram seus votos, coisas que depois, infelizmente não têm mais conserto.
P.S. Republico o texto acima para chamar a atenção aos constantes erros gramaticais muitos dos quais bem crassos (grosseiros), impressos nos jornais locais, que nem sempre respeitam os leitores.
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