Publicado no jornal “A Gazeta” de domingo, 01/08/10
É triste o estado de abandono que se encontra o Centro de Cultura Negra, construído no final da década de 90 no coração do Laguinho: muito lixo amontoado, capim alto, o telhado do prédio afro-religioso que pegou fogo durante uma convenção partidária está sem conserto, o auditório está sujo, vandalizado e coberto de teias de aranha, o museu se encontra com obras e documentos abandonados, vidros das janelas quebrados e à mercê de roubo, etc. Convém contar que o fotógrafo Jonnhy Sena salvou de serem queimadas num monturo de lixo inúmeras fotografias históricas suas que havia doado ao Centro, e da decepção de uma turista ao ver a realidade completamente diferente da que viu postada na Internet.
A construção do prédio, uma reivindicação da comunidade negra, foi marcada por uma luta árdua desempenhada principalmente pelas mulheres do bairro que exigiam o início das obras, já que o prefeito de então, Annibal Barcellos, travava um embate político por causa disso com o governador Capiberibe. As bravas mulheres laguinenses entraram na luta armadas de paus e terçados para evitar que os fiscais da prefeitura derrubassem os tapumes que protegiam a obra em construção. Houve o apoio dos moradores do bairro, através de protestos, abaixo-assinados, e manifestações artísticas em seu redor. Personagens famosos da cidade como Sacaca, músicos e intelectuais aderiram ao movimento pró-construção, visualizando um processo de valorização das comunidades afro-descendentes que precisavam de local para fortalecer sua cultura, seus fazeres, sua identidade.
Até então havia uma entidade fundada dez anos antes que iria estartar toda uma política de valorização do negro do nosso Estado. Era a UNA – União dos Negros do Amapá, àquela altura presidida pela valente Raimundinha Ramos.
O prefeito Barcellos desistiu da briga e a obra prosseguiu. A UNA se instalou no prédio, que foi palco de inúmeras festas e edições do “Encontro dos Tambores”, mas também de intrigas, brigas e acusações nas administrações que se seguiram. Os membros que compõem a diretoria atual se revezam há oito anos, e realizam apenas o Encontro, em novembro. Esse evento é financiado pelos governos municipal e estadual, sem contar as eventuais emendas parlamentares dos deputados federais.
Laguinenses preocupados com a situação de sujeira e abandono do complexo começam a se movimentar para evitar o que já ocorreu há mais de 30 anos, quando o Centro Folclórico do Laguinho, erigido em 1973 pelo governador Lisboa Freire, que adorava o Marabaixo, foi destruído pelo fogo. Um incêndio possivelmente criminoso, já que os moradores reclamavam que as malocas de jussara e palha abandonadas pelo poder público, e caindo aos pedaços eram “a vergonha do bairro”, diziam na época.
Antes de ser Centro de Cultura Negra o local foi campo de treino do Guarani Futebol Clube, Praça Lélio Silva e Praça Lourenço Almeida, e está, sim, abandonado. E embora este artigo não tenha a intenção de sacrificar a atual diretoria da UNA, mas de criticar o atual estado do Centro de Cultura Negra (Vejam bem!), a sua situação é o próprio resultado do descaso administrativo. Lá funcionam algumas entidades como a UNA, a Associação dos Guardas Territoriais, a FEFAP e um ponto de cultura, além de servir para pagamento de bolsa-família e do Pró-Jovem. Porém, alguém precisa responder com segurança a quem pertence realmente o Centro. Eu creio que pertence ao povo afro-descendente, mas ele foi criado pelo Governo Estadual, que através de suas entidades voltadas para o setor, precisa dar uma resposta satisfatória à sociedade. Ele precisa ser imediatamente revitalizado para que os macapaenses não se envergonhem de ver um complexo cultural de tamanha importância para a cidade e para as comunidades afro-descendentes do Estado ficar à míngua. Afinal, ele é o resultado de muita luta contra os políticos que ainda sobreviviam do tempo de arbítrio no país.
Tristes Imagens
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