sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

ANTES QUE EXPULSEM DA SALA A MEMÓRIA DA GRATIDÃO

Professor Munhoz em encontro na casa do escritor Cesar Bernardo.
 Por Benedito de Queiroz Alcântara

CARÍSSIMO PROFESSOR MUNHOZ,

Antes que minha memória seja abduzida para um poço sem fim
Antes que meu coração seja empedrado pelas fúteis vaidades
Antes que minha língua endureça num silêncio forjado
Antes que revisem minha trajetória existencial
Antes que meus olhos não possam mais te identificar
Antes que arranquem meus braços, minhas mãos, meu sorriso.

                Antes que não possas mais caminhar silenciosamente pelas ruas de Macapá
                Antes que não possas mais adentrar nas liturgias da Catedral de S. José
                Antes que não possas mais proclamar as crônicas das tuas andanças
                Antes que não possas mais comentar e questionar a vida humana
                Antes que não possas mais explodir em   saborosas  gargalhadas
                Antes que não possas mais banquetear-se  com nossas comidas típicas.

                                               Antes que te expulsem de qualquer sala
                                               Antes que te esqueçam  hipocritamente em uma solenidade
                                               Antes que te forcem a voltar para a terra  paraoara
                                               Antes que tirem da lista de convidados de uma formatura
                                               Antes que te olvidem dos eventos culturais
                                               Antes que te chamem de ultrapassado e fora de moda.

Antes que...
Antes de tudo isso...

Permita professor querido, proclamar ao mundo, deixar registrado, como testemunho sincero de um ex-aluno do tempo do Colégio Amapaense, anos 1977-1978-1979, hoje um ser calejado, com filhos e trajetórias, professor de cada dia, agradecer  imensamente porque Deus permitiu que um anjo seu viesse em nosso auxílio, deixar indeléveis marcas em nosso caráter, em nossa formação, em nossa visão de mundo e sociedade.

Quero testemunhar que, se hoje estou em sala, foi por causa sim de sua impetuosidade em nos ensinar a Língua Portuguesa e Literatura, como uma verdadeira viagem pelos quatro cantos do mundo, levando-me, imberbe jovem, a optar pela cátedra de história, com o sonho de trilhar as veredas dos lugares e adentrar nas facetas humanas de cada paragem.

Terno Mestre, não tinha como faltar às suas aulas, não tinha como não aproveitar cada minuto, não tinha como estudar por estudar, pois nos atiçavas para abraçar as  aventuras da vida  que a maturidade nos reservava.

No tosco espaço da sala de aula, ciceroneaste nossa curiosidade pelos diversos países, seduzindo-nos para os continentes, os povos e seus costumes, tudo aquilo que de mais belo e singelo o ser humano é capaz de construir.

Enfim, lá fomos nós para o chamado nível superior, sem cursinhos ou meros desafios, apenas com o que comemos e bebemos contigo e outros mestres. Era hora de partir, deixar a terrinha, deixar a família, adentrar nos mares nunca dantes navegados (por nós), não mais como expectadores e sim como atores principais.

Atravessei o Brasil, para o Sul distante e diferente. Depois para o Rio de Janeiro, dantesco e acolhedor. Mais tarde para a América Central, na Nicarágua querida. Até que, com a morte do meu pai Leandro, lá estava em missão por El Salvador e Guatemala, entre os fuzis e helicópteros da guerra maldita, larguei tudo e voltei para os meus,  mais precisamente para ficar com minha mãezinha Maria até os seus últimos dias.

E por aqui fiquei, casei, vieram os filhos, sempre estudando, sempre peregrinando  em sala de aula, envolvido em tantas atividades. E com o privilégio de te encontrar, na maioria das vezes, em nossas ruas e avenidas. E lá ficávamos a conversar, com o tempo parando para nós e correndo para quem nos acompanhava.

Assim vamos atravessando os sertões de nossas existências, eu também já trazendo meus cabelos brancos, que um dia espero que fiquem como os  seus : cálidos e misteriosos.

Permaneço com a  tenacidade de a cada dia adentrar nas salas de aula, desde a 5ª série até o  Ensino Superior. E sempre, sempre, a cada ano, a cada período letivo, citar teu nome para os que hoje me chamam de professor. Recordando cada aula, cada narrativa de suas viagens, cada comentário, que se alojaram dentro de meu coração e que lá permanecerão ad aeternum.

Professor querido, em nome de toda a minha família de irmãos e irmãs que também foram teus alunos, em nome de todos os colegas de todas as turmas do “Colégio Padrão”, quero externar nosso sincero e singelo agradecimento por teres adentrado em nossa formação, em nossas vidas.

Professor querido, valeu  e vale demais saber que tu vieste e permaneceste no meio de nós, desde ontem e para sempre, franciscanamente  único-total-puro-universal. Tão absorto em suas meditações, tão generoso em suas reflexões, tão de tantos rostos e lugares e, maravilhosamente, tão nosso !

Neste dia, dedicado ao professor, antes que tudo desapareça ou desabe, ou que tudo possa ser mudado e esquecido, que eu possa registrar  e proclamar, ao Mestre, com carinho, ao querido Professor Antônio Munhoz Lopes : VALEU !

 Macapá, 15 de Outubro de 2008.




Um comentário:

  1. Junto-me aos teus belíssimos sentimentos junto ao queridissimo Prof Munhoz, desejando-lhe tudo de bom que ele merece.
    Ribamar Pessoa

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