Publicado no jornal “A Gazeta” de domingo, 13.12.2009.
Claro que não é a mesma coisa. Mas já me senti a própria miss da Expofeira deste ano que viu seu direito de ganhar o concurso ser usurpado (propositadamente ou não). Tudo por causa de um suposto erro de contagem do júri.
No meu caso a situação aconteceu nos fins de 1985, quando fui convidado para participar de um festival de samba-enredo da Associação Recreativa Piratas da Batucada, na sede do Trem Desportivo Clube. O tema era “O sonho de um rei”, e o regulamento dava margem para mudar o título, desde que o samba se encaixasse no que os carnavalescos da escola queriam.
Como na época eu pertencia à ala de compositores dos Piratas Estilizados, que era do segundo grupo, resolvi participar. Então convidei o Neck para defender a música “O Rei da Brincadeira”, para a qual fiz os arranjos e acompanhei no cavaquinho. Aconteceu, porém, que o Jeconias Alves de Araújo também estava inscrito no festival, mas não havia encontrado quem interpretasse seu samba. Pediu-me para cuidar disso. Cuidei. Ensaiamos os dois sambas na sede dos escoteiros do Laguinho com uma turma de batuqueiros dos Piratinhas.
No dia anunciado para realizar a escolha do melhor samba – um, sábado - havia seis inscritos. O primeiro a ser cantado, por sorteio, foi o do Jeconias, denominado “Sonho de um Rei”, cantado pelo Neck e acompanhado por mim no cavaco. Os intérpretes do samba seguinte – “O sonho de um pirata”, de Leonardo Trindade - não apareceram. O próximo foi o meu samba, que o Neck interpretou magnífica e profissionalmente, sendo bastante aplaudido. A quanta composição, intitulada “O sonho de um rei no carnaval”, de Alcy Araújo, também não concorreu. Mas as duas seguintes, “Sonho de um rei fantasiado de pirata”, de Venilton Leal, e “Sonho em forma de samba”, de Zoth e Antoney Lima eram muito boas e também foram bastante aplaudidas pela galera do Piratão.
Após uma longa e nervosa espera – um sofrimento para quem participa de festivais – finalmente o presidente do júri anunciou o resultado, favorável ao Jeconias Araújo, que por sinal era compositor dos Piratas da Batucada desde a sua fundação. Jeconias recebeu o cheque no valor de dois mil cruzados novos, contente da vida, enquanto eu e o nosso intérprete nos perguntávamos onde foi que erramos. Mais tarde, tomando uma gelada no badalado bar Balaio, na Praça Nossa Senhora da Conceição, o Jeconias, que depois viria se tornar um grande amigo meu, me esnobou balançando o cheque na minha frente. E nem agradeceu o favor.
Como essas coisas aconteciam nos festivais não liguei muito. Na segunda-feira o Manoel Torres, que fora secretário do júri do festival e pertencia à diretoria da escola, chamou-me na reprografia da Secretaria de Planejamento do Governo do Território, repartição que trabalhávamos. Ele queria me mostrar que o festival tinha sido feito com lisura e honestidade. Para tanto me deu uma planilha com os resultados.
Na ocasião eu estava acompanhado do Rui Lima, que como eu também era técnico da SEPLAN. De posse da planilha o Rui somou rapidamente os resultados com olhos de economista e detectou que o mesmo estava alterado. Em vez de 59 pontos o samba de Jeconias aparecia com 69: 10 pontos a mais. O meu samba havia alcançado 65,5 pontos, portanto eu ganhara o festival.
Não devolvi a cópia da planilha. Guardo-a até hoje. Fui atrás dos meus direitos e os consegui: o samba foi gravado (pelo Neck) e cantado na Avenida FAB no carnaval de 1986.
O ruim disso foi que o Jeconias não recebeu o dinheiro do prêmio e por isso nunca mais fez samba para a sua escola. Por outro lado, no ano seguinte fui convidado pelo Monteiro para fazer o samba que homenagearia o Biroba, espécie de ícone do bairro do Trem. Então o samba ajudou o Piratão a ser campeão pela primeira vez, na FAB. Coisas do carnaval.
Compreendi a intenção do Manoel Torres, que não foi ingênuo, mas honesto; a de Jeconias, um vencedor que não levou o prêmio; e agora a da jovem miss Ellen Paula, que como eu fez seu trabalho, mas que por causa de um erro (intencional ou não) se viu impedida de comemorar a vitória. Mesmo assim eu acredito que sempre há um tempo para corrigir injustiças.
A prova do erro.
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