terça-feira, 28 de agosto de 2012

DOIS POEMAS DE VINÍCIUS DE MORAES



SAI, CÂNCER (*)

Sai,Câncer
Desaparece, parte, sai do mundo
Volta à galáxia onde fermentam
Os íncubos da vida, de que és
A forma inversa. Vai, foge do mundo
Monstruosa tarântula, hediondo
Caranguejo incolor. Fétida anêmona
Carnívora! Sai, Câncer
Furbo anão de unhas sujas e roídas
Monstrengo sub-reptício, glabro homúnculo
Que empestias as brancas madrugadas
Com teu suave ma-cheiro de necrose
Enquanto largas sob as portas
Teus imundos volantes genocidas.
Sai, get-out, va-t-en, hinaus mi inhen
Tu e tua capa de matéria plástica
Tu e tuas galochas
Tu e tua gravata carcomida
E torna abjeto, ao trópico
Cujo nome roubaste. Deixa os homens em sossego
Odioso mascate; fecha o zipe
De tua gorda pasta que amontoa
Caranguejos, baratas, sapos, lesmas
Movendo-se em seu visgo, em meio a amostras
De óleos, graxas, corantes, germicidas.

(*) Extraído de “Sob o Trópico de Câncer”, poema de Vinícius de Moraes.

ÚLTIMAS HORAS (**)

Lavem bem o morto
Com bastante álcool
Depois passem creme
Depois passem talco
E esfreguem extrato
Por todo o seu corpo
Porque ele urinou-se
No último esforço

(**) Poema de Vinícius de Moraes, publicado na Folha de São Paulo em 09.12.1992

Um comentário:

  1. Olá,
    Achei esse blog enquanto procurava conteúdos sobre Vinicius de Moraes. Muito bacana!
    Abraços,
    Lu Oliveira
    www.luoliveiraoficial.com.br

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