JORGE
HERNANY (**)
Hélio, já se passaram algumas horas desde que recebi a
notícia que não queria ouvir. A primeira coisa que consigo raciocinar meio
atordoado é que não irás mais ver a Paula e a Flávia crescerem.
Queria tanto que isso acontecesse. Estou defronte ao Rio
Amazonas te vendo naquela pequena embarcação que vence a imensidão da baía de
Macapá com destino a algum lugar do interior. Tento me apegar à esperança de
que os médicos estão enganados; que ainda te verei entrando por aquela porta a
qualquer instante; que continuarei a receber os teus telefonemas nos fins de
semana pedindo para bater fotos das crianças; que continuarei a te ver
pedalando em frente a cidade. Tento ser o mais severo possível e coordenar as
ideias, mas a realidade agora é uma cruel verdade. Você partiu e não haverá
retorno. Estamos aqui olhando um pra cara do outro sem poder fazer nada,
prostados e de mãos atadas. Em meio a esse momento de apatia e solidão começo a
rir quando vem a memória o nosso primeiro contato. Aquela travessia entre a
cidade de Macapá e a Ilha de Maracá. Estava mesmo cansativa, lembras?
Depois é que fui entender o porquê da tua impaciência
diante de mim, um repórter em começo de carreira querendo puxar uma entrevista
burocrática durante uma viagem enfadonha, quando tudo que você queria era
contar “causos” e gargalhar a vontade. Lembro bem do sutil puxão de orelha que
levei: “rapaz, deixa de ser chato eu sou um contador de estórias e não de
histórias”. Ainda bem que aquela gurijuba cozida somente com água e sal e as
doses de pinga alegraram depois o ambiente. Parece que foi ontem esse ponto de
partida que me faria mais tarde a fazer parte da família.
Hoje contemplo teu corpo inerte na sede da UNA. Ele tem
algo de angelical vestido de branco e com o teu rosto cheio de paz na hora da
partida. De você, só falavam virtudes. Também pudera, não lembram de ti um
gesto de maldade. Como escritor, jornalista e radialista todos são unâmines em
dizer que ninguém foi melhor no jornalismo amapaense para traduzir com
naturalidade cada pedaço de vida do interior do Amapá e exprimir a cultura e o
sentimento caboclo. Se existir um consolo neste momento é justamente saber que
isto ficará para sempre como grande contribuição à nossa história. É o legado
que você deixa como referência para a posteridade. O mínimo que pudemos fazer
foi te levar sob fortes aplausos e, acredita, foram manifestações das pessoas
que sempre te admiraram. Sei perfeitamente que não gostavas de tristeza, mas
não dá para evitar de dizer que ficamos todos órfãos, que estamos sentindo
saudades e choramos a tua ausência. Descanse em paz amigo. Como sabes a Paula e
a Flávia ainda são crianças, indiferentes a nossa dor, mas na hora certa
prometo contar cada página bonita da tua história e certamente elas terão
motivos de sobra para se orgulhar do vovô Hélio.
(*) Publicado no Jornal
“Artecultor”. Sem data.
(**) Jornalista, genro
do Hélio Pennafort, falecido em 01 de fevereiro de 2006.
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