Fernando Canto
Sociólogo
O interessante é que veio logo à memória um “ladrão” de
Marabaixo muito cantado e antigo, cujos versos dizem:
“Eu
vim neste Marabaixo
Você
não me dá alimento
Eu
não sou camaleão
Que
enche o papo de vento”
A estrofe do cantador-compositor mostra logo o seu protesto
contra o festeiro de alguma comunidade distante da sua, que deve ter lhe
oferecido comida, bebida e todas as mordomias da festa para que ele fosse
cantar, e não lhe deu o essencial na hora da fome, querendo dizer que vento não
enche barriga.
Mas quem é esse réptil que a televisão mostrou servindo de
alimento a famílias flageladas na mais recente seca do Nordeste? Quem é esse inofensivo animal, cujos ovos,
chamados “ovas de camaleoa”, são tão apreciados na dieta alimentar de pessoas
aqui na Amazônia? O Aurélio nos diz que se trata de um réptil lacertílio, da
família dos iguanídeos. A maioria tem uma prega mento-faríngea capaz de se
encher de vento, crista serrilhada no dorso, língua curta, grossa e não
protrátil. É arborícola e muda de cor e também é conhecido por papa-vento,
senembi, sinimbu, tijibu, etc. Por desconhecerem a sua importância para o
equilíbrio ecológico das nossas florestas, caçam-no e lhes comem a carne
impiedosamente. No sentido figurado é o indivíduo que assume o caráter
conveniente aos seus interesses; o indivíduo que adapta sua opinião ao
interesse do momento.
E neste justo momento que vivemos um processo de transição
política é que surgem, sem dúvida, bandos de camaleões políticos infiltrados nas
diversas campanhas. Oportunistas, traíras (coitado do peixe!) e cães (“coitado
do melhor amigo do homem”!) subservientes, sem terem nada a contribuir, a não
ser com fofocas e intrigas, enchem o papo de vento para dar a impressão que
tudo sabem. Entretanto querem mesmo é a atenção dos líderes políticos para
poderem viabilizar seus interesses econômicos, políticos e até familiares,
posto o exemplo das oligarquias decadentes do Amapá.
Já vi esse filme. Certamente não se chamava “O Camaleão
Invisível” nem era algum documentário ecológico sobre mimetismo. Era, talvez, a
arte de grudar dissimuladamente em qualquer campanha política, cujos
protagonistas estejam viajando na penumbra sem que disso saibam.
Então, rendo aqui minha homenagem ao camaleão visitador do
meu quintal pelo seu porte aparentemente grotesco; louvo a forma crassa em que
ele veio ao mundo e pelo seu grau na escala evolutiva dos animais, que
desconheço. Ora, eu não o admiro apenas pelo papel que exerce no meio da
floresta. Eu o tenho na memória como um extraordinário ser que, imóvel,
acompanhava o sol na sua trajetória todos os dias aqui entre os perigos da
cidade, sem que soubesse que homens inescrupulosos roubam-lhe o nome e suas
características naturais para se darem bem na vida.
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