quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

A PRAÇA (*)

Texto de Fernando Canto.

Envolto em pequenas preocupações e pequenas alegrias, qualquer um, como eu, diria que há algum tempo a praça pública se constituía um símbolo de liberdade, um lugar de respirar ar fresco, de reunir com os amigos, de passear, namorar, cantar, representar, e externar uma infinidade de verbos que o pensamento e a ação são capazes de elaborar nos momentos bons e nos mais difíceis que o ser humano atravessa.

Hoje não. As cidades crescem, as atividades políticas se pluralizam, as ações econômicas esmagam. A praça fica. O ser humano continua no seu aprendizado de palmatória, não obstante o crescimento das mangueiras, um conserto aqui e outro acolá, uma reforma, uma pintura e o constante passar dos transeuntes. Sim, a praça fica, alheia aos acontecimentos embora seja lugar de dores, alegrias, encantamentos e infortúnios.

Talvez esta crônica tivesse outro rumo se não deparasse com a notícia que uma das mais belas praças de Macapá, a Zagury, não tivesse sido o palco de um crime de morte e de tantas outras delinquências que vêm enlameando as páginas policiais dos jornais locais. Talvez quisesse ou preferisse falar da praça no mais idiota sentido ufanístico ou simplesmente olhá-la como a válvula de escape do caos urbano que poderá vir a ser a velha e combalida São José de Macapá.

Virá a ser um caos, quero dizer, se não se tomarem medidas necessárias para que tenha um funcionamento mais coerente na sua estrutura; um sistema de tráfego mais dinâmico, policiamento adequado e uma série de outras atividades que fazem a cidade ser um lugar habitável, com a sintonia perfeita no planejamento para seu inevitável crescimento, a aplicação de Códigos de Posturas Municipais, do Código de Obras, das Leis de Edificações e do Uso do Solo, da coleta de lixo e das penalidades legais para quem as viola, além da conscientização da população sobre questões elementares de preservação de monumentos e de arborização.

Isso, porém, não é matéria desta crônica. O que me passa neste momento é a preocupação com a Praça Zagury, inaugurada há quase uma década, quando os pessimistas eram contra a construção de praças.

O lugar da antiga Vila Engraáia, onde habitavam os velhos moradores de Macapá, na época da instalação do Território Federal, deu lugar para que Janary começasse seu plano de reestruturação urbana, num lugar “onde tudo estava para ser feito”, no dizer de Álvaro da Cunha. O plano, para alguns, foi uma violação aos direitos dos autóctones. Para outros uma atitude necessária. E a Vila Engrácia desapareceu, ficando apenas as saudades dos moradores negros nos versos do Marabaixo: “Não tenho pena da terra/ só tenho do meu coqueiro”. Essa expressão de revoltada fala do patrimônio plantado por anos a fio, num sentido telúrico do amor ao trabalho e ao futuro dele. Outros ainda cantavam: “Destelhei a minha casa/com intensão e retelhar/ mas a Santa Engrácia não fica/ como a minha pode ficar?”. E a vila desapareceu para que Janary conseguisse seu intento. Mais adiante a rua da praia foi reformada para que se fizesse a Avenida Amazonas, e nela o saudoso Macapá Hotel.

Mais tarde, no inicio da década de oitenta os “os quintais deitados para o rio”, no falar antigo dos cronistas imperiais, foram transformados na praça em homenagem à família de comerciante que habitavam Macapá desde o inicio do Território. E nelas ficaram os coqueiros dos quintais e a brisa permanente do rio-mar.

Antes, falar em praça era falar de saudade, hoje lamentavelmente a tendência de um logradouro como a Praça Zagury é se tornar um ponto de marginais e desocupados que se reúnem para planejar o que podem fazer contra a população que ali vai em busca de lazer.

A segurança que a população espera tem que se efetivada mais rapidamente, não de forma ostensiva, como na época da ditadura, para não assustar as pessoas, mas de forma que possa prevenir quem busca um pouco de paz e sossego nos fins-de-semana, caso contrário os crimes continuarão e os criminosos ficarão impunes e a população cada vez mais assustada.

(*) Publicado no Jornal “Fronteira” – Macapá, 21 de Junho de 1991

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