quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

TIA ZEFA, MINHA RICA MÃE NA VÉSPERA DE UM SÉCULO



Texto de Fernando Canto

               


Foto: Fernando Canto - Arquivo pessoal
Hoje, 26 de fevereiro de 2015, uma das mais antigas moradoras do bairro do Laguinho, dona Josefa Lino da Silva, completa 99 anos.

Carinhosamente conhecida como Tia Zefa, ela é mãe dos meus queridos amigos José Pedro da Silva Ramos, José Isaías (Também conhecido por “Joaquim” ou “Bomba D’água”), Aureliano “Neck”, Joana (falecida), Raimunda Lina, Fina, Ana (falecida) e Rita. É avó do Nilson “Estilizados” (Puxador de Samba), da Paulinha, do Jairo (Porta Bandeira e Mestre Sala dos Estilizados, respectivamente), do Cauã (Mestre Sala Mirim), dos gêmeos batuqueiros Pedro e Paulo e de vários outros componentes da Escola.

Tia Zefa foi uma das habitantes do centro de Macapá que foi remanejada para o bairro do Laguinho em 1944, quando da expansão territorial da capital executada pelo governador Janary Nunes. Reside ainda no mesmo lugar, ali na frente do antigo campo dos escoteiros, onde depois construíram a Cobal e que agora é a sede do SEBRAE, na Avenida Ernestino Borges.
 Ainda hoje ela é vista varrendo a frente de sua casa. Mesmo contrariando os filhos, que pagam uma empregada doméstica para o serviço, ela lava, cozinha e cuida da casa. Nas procissões de São Benedito, padroeiro do bairro e de São José, padroeiro da cidade, lá está ela acompanhando as imagens com os fiéis, às vezes até descalça. No ciclo do Marabaixo lá está ela, dançando, com quase a mesma disposição, lembrando dos velhos tempos. Sua lucidez permitiu que muitos estudantes e pesquisadores pudessem conhecer nosso folclore e a história dos afrodescendentes locais através dos versos dos ladrões de Marabaixo.

Neste momento em que está ocorrendo uma missa de Ação de Graças pelo seu aniversário, junto-me ao sentimento de todos seus familiares pela longa presença dessa pessoa iluminada na face do planeta, que carrega o fado de saber das nossas coisas e de tê-las testemunhado. Louvo, assim, sua preciosa memória que é plena de significados individuais e coletivos e fonte inesgotável de informações. Ela é sujeito da história e voz de muitos sujeitos. Sua memória permitiu a recuperação de uma visão de mundo, pois vivenciou a experiência e nos deu a riqueza de uma história mais comovente e verdadeira.

A Tia Zefa também é compositora. Entre tantos ladrões que cantam nas festas de Marabaixo sem saber o verdadeiro autor, ela nos deixou estes versos:
                Mamãe, minha rica mãe
                Ora veja o mundo como é que está
                Ainda há moça que se ilude
                Por moço deste lugar.

Foto: Fernando Canto - Arquivo pessoal
A contribuição da Tia Zefa, nestes últimos tempos em que se percebe uma necessidade vital de se trabalhar em busca da identidade local, foi fornecer matéria-prima para tantos TCC’s, monografias, dissertações e teses. Essas pesquisas evitam a diluição e os esquecimentos de circunstâncias e momentos não registrados. A memória da Tia Zefa é, então, o segredo da identidade, porque vive o que não somos mais.
Perto de completar um século, e saudável, física e mentalmente, Tia Zefa traz esse privilégio de poucos. Respeitadora do sentimento alheio, não fez nenhuma festa devido ao recente falecimento de sua irmã e das amigas Ondina e Chiquinha do Bolão, outras mulheres negras e representativas da cultura popular do Amapá.

Deixo aqui para a Tia Zefa, seus filhos e descendentes, minhas felicitações pelo seu aniversário de 99 anos. Que Deus a proteja sempre e que ela continue a nos ensinar com a sua humildade e conhecimento as coisas do Amapá, pois ela sabe também que não são só as moças “que se iludem com os moços deste lugar”. Todos nós nos iludimos com as coisas: nós eleitores, nós consumidores, principalmente quando a memória trai e o tempo faz esquecer a política e os valores humanos mais importantes. Parabéns, Tia Zefa (Minha Rica Mãe), pelo aniversário e pelo seu legado.

                

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

De novo o nome do Teatro.

 
Foto: edgar-amapa.blogspot.com
 Como são as coisas... Uma postagem irresponsável (Sim, porque a informação está incompleta: quem são os que “querem” acrescentar o nome do Pádua ao Teatro das Bacabeiras?) no FB do publicitário Walter Junior do Carmo fez emergir mágoas acumuladas há quase trinta anos. A Alcinéa não perdoa ninguém pelo fato de não ter sido dado ao Teatro o nome do querido poeta e meu amigo Alcy Araújo. O Olivar Cunha que o diga, pois desde essa época ela tem ódio do pintor, por uma declaração que ele fez à TV Amapá. E nunca houve esse negócio de o governador Jorge Nova da Costa querer dar o nome do Alcy. Tudo foi originado por uma carta assinada pelo irmão da Alcinéa protocolando o pedido para que o governador desse o nome dele ao Teatro. Mas Jorge Nova chamou os artistas e produtores culturais para debater o assunto, já que a informação tinha vazado e os artistas fizeram um abaixo-assinado se posicionando contra. Foram dadas muitas sugestões de nomes, tais como Pororoca, Mururé, Encontro das Águas, Bacabeiras, etc. Venceu o nome Teatro das Bacabeiras pelo fato de trazer o nome que supostamente originou a palavra Macapá e, por isso mesmo se identificar com as coisas da terra.

   O debate em curso agora vem ganhando outra conotação que não o acréscimo do nome do Pádua ao Teatro, tudo por conta da vaidade, da mágoa, do ódio, do rancor e da mentira. Devo dizer à prezada poeta Alcinéa que eu não tenho nenhuma música com o nome Pérola Negra, e olha que eu conheço todas elas. Tenho, sim, uma música chamada Pedra Negra, que fala sobre o problema da exploração do manganês na Serra do Navio, apresentada no I FUMAP, em 1979, e gravada em 1986 pelo grupo Pilão. Se alguém sugeriu esse título decerto não fui eu. Nem preciso disso. Não tenho essas vaidades. Eu tenho boa memória e há muitos anos trabalho na área da cultura buscando o fortalecimento de nossa identidade, inclusive estudando a fundo o assunto, que ora é objeto de pesquisa, juntamente com a Fortaleza de São José de Macapá, da minha tese de doutorado institucional em Sociologia na UFC.


   Sobre a possível mudança do nome do Teatro já dei minha opinião no texto originário do FB do Walter. Eu reafirmo que o Pádua foi um grande amigo que tive e continuo acreditando que ele merece reconhecimento póstumo. Ainda continuo defendendo o nome Teatro das Bacabeiras, mais fortalecido ainda pelos comentários dos amapaenses e pela vontade daqueles que na época – a maioria dos artistas – elegeram democraticamente o nome da nossa casa de espetáculos, provando que não existe esse negócio de “vontade política” do governante, mas sim pressão popular.